quinta-feira, 19 de julho de 2012

Uma Educação voltada ao ser humano... Seria apenas um sonho?

Estou publicando o texto de nosso querido Gaudencio sobre a Polissimia, por que penso ser este um alicerce ao nosso  aperfeiçoamento no mundo da Educação.
Sonhei sempre com uma Educação Libertadora do Sujeito. Para isso minha mãe dizia para meu pai que não podiam permitir minha insistência em querer estudar. Morávamos longe mais o menos 10 quilometros da escolinha mais próxima... Eu precisava ir de pés descalsos muitas vezes, ou então levar uma conguinha na sacolinha para atravessar um terreno encharcado e pular um rio que muitas vezes a ponte era levada com as chuvas e alagamentos no local. Mas eu não desistia... Passava o local, aproximava do outro lado e lá dava uma lavadinhas nos pés, secava com uma toalhinha, enfiava um par de meias e calçava aquelas congas que para mim era o melhor momento, meus pés se aqueciam e paravam de doer, pois os pedaços de espinhos ficavam ali machucando meus pés o tempo todo ...Sinto isso ainda em mim, quando paro para pensar nestes momentos. Minha mãe queria fazer eu parar, esperar mais um tempo, pois sentia medo, eu tão pequeninha andando pelos ca minhos daquela maneira, ela e meu pai se revezavam um levava até uma altura e outro buscavam-me... Meu irmão querido ao fazer 4 aninhos se canditaou em ir para escola comigo... assim mamãe e papai  não se preocupavam tanto, apesar que papai ia sempre nos buscar em uma altura do caminho... Me sinto culpada, meu irmão estudou até a 7ª série e disse não vou mais! Chega não consigo sofrer tanto assim, quero trabalhar e pronto. Assim fez foi para a lavoura. Trabalhava de sol a sol sem se lamentar, ainda ajudava papai e eu  nas minhas despesas para que eu pudesse me manter estudando. Mas odoiu o ensino, a Educação... Ele falava para mim que se fosse para estudar com todo esses sacrificios e ainda chegar na escola e muitas vezes ser maltrado por algum professor mal humorado, ele não ia mais continuar.
Ele não conhecia muito dos itens educacionais, mas já pensava e discutíamos sobre uam EDUCAÇÃO DIFERENTE, HUMANIZADORA! QUE O SUJEITO FOSSE INCLUÍDO NESTES PROCESSOS, UMA EDUCAÇÃO QUE ESTIVESSE VOLTADA NO VALOR HUMANO E NO DESPERTAR DO SER, VALORIZANDO, DESPERTANDO E INCENTIVANDO A PESSOA A QUERER SER GENTE AUTÕNOMO E INDEPENDENTE SUPERANDO SUAS DEFICIÊNCIAS  E OS MÉTODOS EXCLUSIVOS DO MERCADO CAPITALISTA E SELVAGEM....
TRABALHO E EDUCAÇÃO


A polissemia da categoria trabalho e a batalhas das idéias nas

sociedades de classe*

Gaudêncio Frigotto

Resumo

O presente artigo analisa, inicialmente, a polissemia da categoria trabalho como resultante de

uma construção histórico-social e, em nossa sociedade, com o sentido de dominação de classe. Em

seguida discute a abordagem de Sérgio Lessa que sustenta que a perda da precisão semântica do

vocábulo trabalho advém do abandono da análise imanente e ortodoxa do trabalho na perspectiva do livro

I de O Capital de Karl Marx e tem como conseqüência a não distinção entre proletários e trabalhadores e

a definição de quem é hoje a classe revolucionária. Este abandono, de um lado levaria a autores da

tradição crítica nas ciências sociais a darem adeus ao trabalho e a educadores, deste mesmo campo, ter a

ilusão de dimensões positivas da ciência e tecnologia e da educação politécnica ou omnilateral dentro da

sociedade capitalista. Numa mesma direção de análise Paulo Tumolo critica os educadores que vêem a

possibilidade da educação politécnica e do trabalho como principio educativo dentro da sociedade

capitalista. Com base em autores marxistas que pensam com Marx para além de Marx, o artigo conclui

que o deslocamento da perspectiva imanente e heurística para estudos e pesquisas do processo histórico

sobre trabalho, classe e classe revolucionária, conduziu a Lessa e Tumolo a uma análise centrada em

antinomias. O abandono na suas análises das contradições pode ter como conseqüência, certamente não

intencional, um duplo risco. O primeiro é de conduzir, no campo político, a um imobilismo e a um beco

sem saída, colocando para um imaginário futuro a tarefa de superação do trabalho, da ciência e da técnica

e da educação alienadores .O outro risco, este específico para o campo da educação, é de que, ao tratar as

análises dos pesquisadores criticados, mesmo com as ressalvas feitas, de ilusões ou lemas sem

consistência teórica, acabe-se reforçando as posturas conservadoras e neoconservadoras ou pós-modernas

já hegemônicas nestes tempos de capitalismo tardio..

Palavras chaves. Polissemia, trabalho, classe, classe revolucionário, tecnologia , Educação politécnica

Abstract

The present article at first examines the polysemy of the labour category as a result of a sociohistorical

construction and, in our society, with the meaning of class rule. Then it discusses the approach

of Brazilian writer Sérgio Lessa, who holds that the loss of semantic precision of the word labour derives

from the abandonment of the immanent and orthodox analysis of labour from the perspective of book I of

Karl Marx’s Capital and results in the non-distinction between proletarians and workers and the

definition of who is the revolutionary class today. This abandonment, on the one hand, would lead authors

within the critical tradition in the social sciences to give up labour and educators, within the same field, to

have the illusion of positive dimensions of science and technology and of polytechnical or omnilateral

education in a capitalist society. In the same direction of analysis, Brazilian Paulo Tumolo criticizes

educators who see the possibility of polytecnical education and labour as an educational principle in a

capitalist society. On the basis of Marxist authors who think with Marx beyond Marx, this article

concludes that the displacement from the immanent and heuristic perspective to studies and researches of

the historical process about labour, class and revolutionary class have led Lessa and Tumolo to a

antinomy-centred analysis. The abandonment of contradictions in their analyses may result in a double

risk, certainly not an intentional one. The first is to lead, in the political sphere, to immobilism and a

deadlock, leaving for an imaginary future the task of surpassing alienating labour, science, technique and

education. The other risk, this specific to the education, is that, by seeing the analyses of the researches

criticized as illusions or mottos with no theoretical consistency, even with the reservations made, the

conservative and neoconservative or post-modern postures already hegemonic in these times of late

capitalism are reinforced. .

* Agradeço a leitura de uma versão preliminar do texto e as ponderações que me foram feitas por Maria

Ciavatta, Eunice Trein, Sônia Maria Rummert, Marise N. Ramos e Carlos Roberto Alexandre. Muitas das

observações e indicações foram cruciais para o que resultou como versão final para discussão. Nenhum

deles, todavia, é responsável por lacunas ou posicionamentos que assumo no texto.

2

Keywords: Polysemy, labour, class, revolutionary class, technology, polytechnical education

Até os nossos dias, a história de toda a

sociedade tem sido a história das lutas de

classe (Marx e Engels, 1998)

Introdução

Diz-se que um termo é polissêmico quando é utilizado com várias significações.

Por exemplo, ao examinar as relações sociais de produção na especificidade da

sociedade capitalista, Marx mostra que produtivo é o trabalho que produz mais-valia.

Este, todavia, não é o sentido dado pelo pensamento liberal nem pelo senso comum. No

pensamento econômico liberal, é uma relação entre os insumos aplicados e o resultado

da produção. No sentido dicionarizado, usualmente trabalho produtivo é aquele que

rende mais, que produz mais ou é mais eficaz.

Neste texto, que visa estimular o debate sobre a relação trabalho, classe social e

educação não vou ater-me particularmente à dimensão semântica do trabalho para

evidenciar as mudanças de sentido sofridas do mesmo no tempo e no espaço. Primeiro

por não ser este meu campo de formação e, muito menos, de estudos e pesquisa.

Segundo, e fundamentalmente, porque no exemplo acima o cerne da questão não é uma

disputa semântica abstraída das relações sociais. Na sociedade capitalista é uma disputa

de classe que somente pode ser apreendida em sua historicidade dentro de uma

concepção dialética e no campo das contradições e não das antinomias.

A opção do encaminhamento que darei ao texto busca no legado de Marx a

compreensão de que não é a consciência, a teoria e a linguagem que criam a realidade,

mas elas são produzidas dentro e a partir de uma realidade histórica, sendo e tornandose,

porém, elas mesmas parte dessa realidade. Daí que, para Marx e Engels, nenhuma

idéia, preconceito, ideologia ou teoria deve deixar de ser examinada, já que todas elas se

constituem em elementos constitutivos da realidade e parte de determinadas práxis

(alienadas ou críticas).

A produção das idéias, de representações da consciência, está de início

diretamente entrelaçada à atividade material e ao intercâmbio material; (...) os

homens são produtores de suas representações, de suas idéias etc., mas os

homens reais e ativos (...). A consciência jamais pode ser outra do que o ser

3

consciente e o ser dos homens é seu processo de vida real (Marx & Engels,

1986, p. 36-37, grifo meu).

Esta compreensão conduz-me ao pressuposto de que os sentidos e significados

do trabalho resultam e constituem-se como parte das relações sociais em diferentes

épocas históricas e um ponto central da batalha das idéias na luta contra-hegemônica à

ideologia e à cultura burguesas Esse pressuposto, como conseqüência, leva-me ao

mesmo tempo a compreender e tratar as relações de produção e de reprodução sociais, a

linguagem, o pensamento e a cultura de forma histórico-dialética e, para não cairmos

numa discussão abstrata, atemporal ou – nos termos de Marx – escolástica, que o

sentido do trabalho, expresso pela linguagem e pelo pensamento, só pode ser

efetivamente real no campo contraditório da práxis e num determinado tempo e

contextos históricos.

A questão de saber se cabe ao pensamento humano uma verdade objetiva não é

uma questão teórica, mas prática. É na práxis que o homem deve demonstrar a

verdade, isto é, a realidade e o poder, o caráter terreno do seu pensamento. A

disputa sobre a realidade ou não-realidade do pensamento isolado da práxis - é

uma questão puramente escolástica (Marx, 1986, p. 12).

Se por um lado, então, é crucial voltar aos textos de Marx e Engels e de outros

pensadores marxistas buscando seu sentido imanente e o rigor semântico como

exercício de não nos afastarmos dos fundamentos da concepção materialista-histórica da

realidade humana ou social e do método dialético de construção de sua compreensão, o

grande desafio, todavia, em nosso tempo, como adverte Francisco de Oliveira, é “não

alcançar-se a saturação histórica do concreto, isto é, não saber apanhar a multiplicidade

de determinações que fazem o concreto" (Oliveira, 1987a). Vale dizer, seguir o legado

de Marx e de Engels, que é “compreender toda a realidade em seu movimento, nas suas

‘tendências’ – portanto, na ‘unidade’ dos seus diferentes aspectos e ‘contradições’”

(Lefebvre, 1981, p. 295-296).

Ao abordar a concepção materialista de história, Engels, em carta a C. Schmidt,

adverte sobre o risco de seu uso apenas como rótulo.

Sobretudo a palavra “materialista” serve, na Alemanha, a muitos escritores

jovens como uma simples frase com que se rotula todo e qualquer estudo, ou

seja, coloca-se o rótulo e crê-se ter encerrado então o assunto (...). Toda a

história precisa ser reestudada, as condições de existência das diversas

formações sociais precisam ser examinadas em detalhe, antes de induzir delas as

correspondentes concepções políticas, jurídicas, estéticas, filosóficas, religiosas

etc. (Engels, 1983, p. 456).

4

Por certo, no plano mais geral, Edward Thompson, Raymond Williams, Eric

Hobsbawm, Antonio Gramsci e, no Brasil, Francisco de Oliveira e Florestan Fernandes,

Leandro Konder e Carlos Nelson Coutinho, entre outros, são intelectuais pesquisadores

que pensam com Marx para além de Marx1. Ou seja, pensadores que, pela pesquisa e

análise sistemática, buscam não se afastar dos fundamentos e saturar as categorias e

conceitos (trabalho, classes sociais, Estado, cultura, democracia, luta de classe etc.), no

movimento mais universal do sistema do capital e na especificidade de diferentes

formações históricas capitalistas.

A construção da categoria capitalismo dependente, em Florestan Fernandes

(1975 e 1981) e Rui Mauro Marini (2000); a crítica da razão dualista atualizada, trinta

anos depois, com um texto sob a metáfora do ornitorrinco, em Francisco de Oliveira

(2003); e a análise da questão da democracia e da relação Estado e sociedade civil, em

Carlos Coutinho (2002), são abordagens que explicitam a especificidade do capitalismo

no Brasil dentro do movimento do sistema do capital. No âmbito mais geral, Francisco

de Oliveira (1998), em Surgimento do anti-valor, traz à luz a forma mediante a qual o

capital se reproduz e amplia cada vez mais dependendo do fundo público e as

conseqüências para a luta de classes da disputa por seu controle e manejo2. Konder

(1992 e 2001) dialoga sobre o pensamento de Marx no século XXI, o futuro da filosofia

da práxis e a leitura crítica da história.

Estas demarcações introdutórias objetivam explicitar a direção dentro da qual

gostaria de abordar dois pontos inter-relacionados.

No primeiro, busco sinalizar que a polissemia da categoria trabalho resulta de

uma construção social e, em nossa sociedade, com o sentido de dominação de classe. O

1 Tomo esta formulação de Wolfgang Leo Maar (2006) em um texto no qual aborda a Teoria crítica da

sociedade brasileira de Francisco de Oliveira. Trata-se de uma expressão precisa que sintetiza a forma

mais radical de ser fiel ao pensamento de Marx: trabalhar o presente na relação entre o estrutural e o

conjuntural dentro de sua concepção materialista histórica da realidade e o método materialista histórico

de compreendê-la, que implica, em cada formação histórica, identificar e analisar as mediações e

contradições que produzem a realidade humano-social em sua particularidade, singularidade e

universalidade.

2 Por uma destas raras coincidências, exatamente no dia 29 de setembro de 2008, declarado o pior da

história das bolsas ou da jogatina do capital fictício onde o fundo público americano anunciava que

injetaria US$ 700 bilhões para socorrer a hecatombe do livre mercado e o mesmo rumo foi seguido para

segurar a quebradeira na Europa, Francisco de Oliveira encerrou, na Universidade do Estado do Rio de

Janeiro, com o debate sobre o sentido atual do Manifesto Comunista, um curso livre sobre obras de Marx.

Não só pôde reiterar que “tudo o que é sólido se desmancha no ar” como sentir que o que anunciou

exatamente uma década atrás, em seu livro Surgimento do anti-valor, assume agora uma evidência

histórica contundente e para o sistema capital em conjunto.

5

grande desafio é apreender, no tecido social do senso comum, das religiões e das idéias

do pensamento e da ciência positivista e pragmática dominante, qual o mosaico de

sentidos que assume o trabalho.

No segundo, que tem origem e está vinculado ao primeiro, ocupo-me de dois

aspectos também imbricados. Em recente livro, Sergio Lessa (2007) aborda a perda da

precisão semântica do vocábulo trabalho e as conseqüências para definição de quem é,

hoje, o proletariado, a distinção entre proletários e trabalhadores e o que é hoje a classe

revolucionária. Partindo da análise da compreensão ontológica de trabalho numa

perspectiva imanente e dentro da ortodoxia e centrado particularmente no Livro I de O

Capital, justificando sua prioridade exegética, salienta que, em Marx, por trabalho se

entende o intercâmbio orgânico do ser humano com a natureza e a atividade que

transforma a matéria natural. Compreensão esta que, para Lessa, permite definir quem

é hoje o proletariado e a classe revolucionária.

Sobre esta base, analisa parte da obra de três autores brasileiros: Ricardo

Antunes, Marilda Villela Iamamoto e Dermeval Saviani, e sustenta que estes, por perda

dessa precisão, dão o adeus ao trabalho no Brasil3 e à identificação de quem pertence

ou não ao proletariado e à classe revolucionária. Ao abordar a obra de Saviani e

referindo-se a alguns dos mais significativos pedagogos de esquerda, destaca que essa

incompreensão semântica “tornou aos educadores mais complicada e difícil a percepção

da essência das transformações em curso: a passagem de um patamar mais elevado de

extração de mais-valia, uma intensificação dos processo alienantes oriundos do capital”

(Lessa, 2007, p. 121). Para ele, isso decorre de ilusões de Saviani e desses pedagogos da

possibilidade, sob o sistema capitalista, da existência de alguma positividade do

desenvolvimento científico e tecnológico, dos avanços das forças produtivas ou de que

as transformações que possam ser disputadas e capturadas pelas forças comprometidas

pela emancipação humana. Da mesma forma, decorrem as ilusões sobre a possibilidade

de construir uma educação geral, omnilateral ou politécnica dentro do sistema

capitalista.

Na mesma direção de análise imanente de textos de Marx feita por Tumolo

(2003), procuro analisar as implicações, no plano teórico e político-prático, da defesa

que ele busca sustentar de que o trabalho, sob o sistema do capital, não pode ser

3 Lessa refere-se às teses do fim do trabalho desenvolvendo, em seu livro, três capítulos. No primeiro, o

adeus ao trabalho dado por S. Malett e André Gorz; no segundo, o adeus ao trabalho de M. Sabel a J.

6

entendido e pensado como principio educativo, isto porque é cada vez mais alienante.

Ou seja, o trabalho, neste caso, seria pura negatividade e por isso impensável como

principio educativo.

Registro de imediato que as objeções que explicito nesta discussão não se

referem à pertinência de efetivar análises imanentes dos textos de Marx ou outros

pensadores clássicos. Portanto, o intuito não é desclassificar ou menosprezar sua

produção. Pelo contrário, entendo essas análises como um trabalho intelectual

fundamental, com o qual compartilho. Da mesma forma, compartilho da crítica relativa

à forma cada vez mais destrutiva e violenta do sistema do capital e de sua natureza não

reformável.

O ponto crucial a ser debatido é a passagem da compreensão imanente do

trabalho, da classe proletária e do sujeito revolucionário, para a análise ou julgamento

de trabalhos que se centram, há décadas, em desenvolver pesquisa histórico-empírica e

que pensam com Marx para além de Marx.

O que procurarei mostrar é que as análises de Lessa e Tumolo, na especificidade

e natureza diversa dos dois trabalhos a que me refiro neste artigo, podem estar

incorrendo nessa impropriedade. Isso pode ter como conseqüência, ainda que não

intencional, em nome da imanência e da ortodoxia, por um lado, congelar a saturação

histórica das categorias e conceitos e, com isso, o legado fundamental de Marx de

perquirir a relação do estrutural e conjuntural no tempo e no espaço, nas mediações e

contradições singulares, particulares e universais da realidade que queremos

compreender; e, por outro, conduzir ao imobilismo no plano da práxis, ponto nodal da

luta de classes para a superação das relações sociais capitalistas.

As mediações histórico-sociais da polissemia da categoria trabalho

e a batalha das idéias

A proposta do tema polissemia do trabalho, de início, trouxe-me desconforto.

De um lado, por não ter acompanhado a natureza do debate ou a controvérsia que

gerou; de outro, pelo receio de que o tema pudesse conduzir a discussões muito

descoladas das questões que emergem da vida real dos trabalhadores: dos diretamente

Lojkine e Adamn Shaff; e, finalmente, no terceiro capitulo dedica-se ao adeus ao trabalho no Brasil dado

pelos autores mencionados.

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superexplorados ou pela extração da mais-valia (trabalho produtivo, em termos de

Marx) ou superexplorados em atividades, serviços no campo da educação, cultura,

saúde etc., nas diferentes esferas do Estado (trabalho improdutivo) ou jogados na vala

comum da precariedade da grande maioria dos que atuam na informalidade ou

diretamente não necessários à produção4. Aí a disputa dos sentidos do trabalho poderia

estar isolada da práxis e tornar-se uma discussão puramente escolástica.

Esse desconforto foi se desfazendo e fui percebendo a pertinência e a

necessidade deste debate, na direção apontada, especialmente pelas conseqüências que

podem advir de um encaminhamento das questões postas se perdermos de vista que o

objetivo fundamental é a crítica das relações sociais e dos processos formativos e

educativos que reproduzem o sistema do capital e todas as suas formas de alienação.

Mas, concomitantemente, na luta contra-hegemônica e no terreno contraditório que a

realidade histórica (realidade rebelde, na expressão de Gramsci) nos coloca para a

travessia, onde a disputa cultural e do sentido da ciência, tecnologia e dos processos

educativos na sociedade e na escola se constituem em mediações cruciais na

possibilidade de superação do sistema do capital

Todavia, o entendimento da pertinência do tema carregou consigo uma enorme

perplexidade pela natureza complexa da tarefa; neste artigo, o que posso alcançar é

apenas a problematização e uma abordagem introdutória. Como efeito, quando

escrevemos nossos textos supondo que os leitores – alunos de graduação e de pósgraduação,

professores que atuam nas redes de ensino público e privado ou lideranças

de movimentos sociais e sindicatos etc. – apreendam os sentidos e distinções que foram

sendo construídas sobre trabalho na sua dimensão ontológica, principio educativo ou

trabalho alienado por sua subordinação ou subsunção real; trabalho concreto e

abstrato, produtivo e improdutivo, trabalho material e imaterial e mundo da

necessidade e da liberdade etc., por certo, estamos ignorando lições que a literatura

marxista engendra.

4 A categoria de trabalho informal, por diferentes razões, no desmanche e precarização do trabalho, não

dá conta de nos ajudar a aprender os “mundos do trabalho” (Hobsbawm, 1987) daqueles que não são

incorporados diretamente no emprego formal. Ver Tavares (2004). Uma realidade que advém, como

Marx indicava nos Manuscritos econômicos, da forma que se desenvolve, sob o capitalismo, a atividade

humana. “Substitui o trabalho por máquina, mas lança parte dos trabalhadores de volta a um trabalho

bárbaro e faz da outra parte máquinas” (Marx, 2004, p. 82).

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O fato de crescente contingente da população que tem experiência concreta de

classe trabalhadora brasileira sem que, como indica Edward P. Thompson5, tenha

consciência de classe acredite, ao seguir a Igreja Universal ou congêneres, que

presencia milagres, exorcismos e prosperidade não é uma quimera. É um dado real

existencial que tem de ser, primeiramente, entendido como indica Marx ao discutir a

religião na Introdução à crítica da filosofia do direito em Hegel e na Questão judaica.

É este o fundamento da crítica irreligiosa: o homem faz a religião, a religião

não faz o homem. [...] Mas o homem não é um ser abstrato, ancorado fora do

mundo. [...] a miséria religiosa constitui ao mesmo tempo a expressão da

miséria real e o protesto contra a miséria real (Marx, 2006, p. 145).

A razão fundamental, então, da necessidade de compreender a polissemia da

categoria trabalho não é apenas e, sobretudo, semântica, teórica e epistemológica, ainda

que mediada por essas dimensões, mas de natureza histórico-social, ontológica e éticopolítica.

Por certo o mais comum é que a grande massa dos que pertencem e têm

experiência real de classe trabalhadora e que não necessariamente têm consciência de

classe tome trabalho e empregocomo sinônimos, assim como o de classe como um

contínuo de estratificações, um senso comum imposto pelo pensamento sociológico,

econômico e político e sedimentado dia a dia pela mídia: classe A, B, C, D, E...

Do mesmo modo, é difícil que a grande maioria dos professores, mesmo com

níveis de escolaridade elevados, compreenda por que, se de manhã eles trabalham numa

escola privada (na qual são explorados) e pela tarde trabalham numa escola do Estado

desmantelada ( na qual também são explorados), pela manhã seu trabalho é produtivo e

pela tarde é improdutivo, ou por que, pelo fato de serem professores, não são proletários

ainda que trabalhadores expropriados. Por outro lado, é comum que, em pesquisas com

mulheres que fazem trabalho doméstico, embora tenham jornada tripla de trabalho,

afirmem que não trabalham. Todas essas situações expressam uma determinada

filosofia, popular ou científica, certa prática econômica e hegemonia política.

5 A obra do pensador marxista Edward P. Thompson tem a particularidade de ser produzida pela pesquisa

histórica e a intensa vivência como educador popular. Por isso, sua produção sobre a formação da classe

operária inglesa ou, como ele mesmo expressa, o fazer-se classe operária envolve tanto as dimensões

econômicas e políticas quanto as culturais mediadas por experiências, tradições, sistema de valores e

vivências concretas. Ver Thompson (1987a, 1987b, 1987c e 1981).

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Por isso, num terreno mais profundo da construção dos sentidos de trabalho que

coexistem na sociedade brasileira hoje, a indicação de Gramsci sobre concepção de

mundo é de extrema pertinência.

Quando a concepção de mundo não é critica e coerente, mas ocasional e

desagregada, pertencemos simultaneamente a uma multiplicidade de homensmassa,

nossa própria personalidade é composta de uma maneira bizarra: nela se

encontram elementos dos homens das cavernas e princípios da ciência mais

moderna e progressista; preconceitos de todas as fases históricas passadas,

grosseiramente localistas e intuições de uma futura filosofia que será própria do

gênero humano mundialmente unificado (Gramsci, 1978, p. 13).

Isto indica que captar os sentidos e significados do trabalho na experiência social

e cultural das massas de trabalhadores é tarefa complexa e implica analisar como se

produz a sociedade nos âmbitos da economia, da cultura, da política, da arte e da

educação. Na perspectiva de Florestan Fernandes, implica

[...] repor o intelectual no circuito das relações e conflito de classe [...]. Mas de

nada adiantaria uma retórica ultra-radical de condenação e de expiação: o

intelectual não cria o mundo no qual vive. Ele já faz muito quando consegue

ajudar a compreendê-lo e explicá-lo, como ponto de partida para sua alteração

real” (Fernandes, 1980, p. 231.)

Posta a compreensão da polissemia da categoria trabalho nesta perspectiva,

percebo que em parte ela está em curso, mas que a tarefa é imensa e demanda o esforço

de pesquisa de um amplo coletivo. No escopo deste texto, é possível apenas sinalizar o

que está sendo produzido no debate da polissemia da categoria trabalho e delinear, no

campo marxista, onde percebo as fontes teóricas que pensam com Marx e que vão além

de Marx para avançar neste terreno.

Este segundo aspecto permite encaminhar a direção do debate dos pontos

seguintes da importância de ir-se aos fundamentos do pensamento de Marx, Engels etc.,

mas que, concomitantemente a esses fundamentos, eles têm de ser historicizados na

linha da advertência de Engels, de que formações sociais precisam ser examinadas em

detalhe antes de induzir delas as correspondentes concepções políticas, jurídicas,

estéticas, filosóficas, religiosas. Para Engels, “analisando as tendências de seu tempo

sem esse cuidado o fraseado do materialismo histórico somente serve para que os

jovens construam às pressas, a partir de seus conhecimentos históricos escassos [...]

todo um sistema e aparecem, então para si próprios como colossais” (Engels, 1983, p.

457).

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Indicações sobre a polissemia da categoria trabalho, emprego e classe social

Um breve inventário evidencia que, tanto dentro da perspectiva marxista

quanto dentro de outras perspectivas, há pesquisas que se ocuparam primeiramente de

discutir diferentes qualificações que recebe o termo trabalho. Num nível mais simples,

mas importante, encontramos verbetes, com algum detalhe, sobre as várias

qualificações. Uma segunda dimensão, mais complexa, é buscar apreender o sentido

delas em sua historicidade e como são apreendidas na vida real da classe trabalhadora.

Sobre o primeiro aspecto, em relação ao trabalho, apenas para exemplificar,

no Dicionário do pensamento marxista de Tom Bottomore (1988) encontramos

especificações sobre trabalho abstrato, trabalho doméstico, divisão do trabalho, trabalho

e força de trabalho e a natureza do trabalho na transição para o socialismo. Na literatura

brasileira, dois textos recentes têm clara preocupação de abordar as várias dimensões

em que o trabalho é tratado com fins pedagógicos. Recentemente, a Escola Politécnica

Joaquim Venâncio (2006) publicou o Dicionário da educação profissional em saúde, no

qual diferentes autores abordam os verbetes sobre trabalho, trabalho abstrato, trabalho

concreto, trabalho simples e complexo, trabalho real e trabalho prescrito, divisão social

do trabalho e divisão técnica do trabalho. Com o mesmo propósito, Catani (2002),

organizou um dicionário sobre trabalho e tecnologia focando, sobretudo, as formas de

organização do trabalho.

Estas produções ajudam para uma primeira e importante aproximação das

diferentes dimensões do significado e dos sentidos em que o trabalho, dentro de uma

perspectiva marxista, é abordado e indicam as fontes nas quais os leitores podem

aprofundar tal compreensão e situar-se no debate. Algumas dessas dimensões renderam

vários trabalhos, como a questão do trabalho produtivo e improdutivo em Marx6.

Num horizonte de dimensão mais complexa, porque implica captar as

múltiplas mediações constitutivas da polissemia do trabalho social e historicamente

produzidas, encontramos a contribuição de diferentes trabalhos no debate marxista ou

não. Um pequeno texto de Nosella (1989) foi, sem dúvida, o primeiro dentro do GT

6 Ver a esse respeito, entre outros autores que efetivam esse debate: Rosdolsky (2001), Mandel (1998),

Robin (1980) e Napoleoni (1981) e Singer (1981).

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Trabalho e Educação a sinalizar os sentidos que assume a categoria trabalho na

Antiguidade, na sociedade moderna burguesa e como se anuncia dentro da utopia de

uma sociedade sem classes. Um texto que demarca, pois, a historicidade dos sentidos e

significados que assume o trabalho.

Uma coletânea organizada por Danile Mercure e Jean Spurk, publicada na

França em 2003 e traduzida pela Editora Vozes em 2005, dentro de uma abordagem não

especificamente marxista, propõe uma ampla compreensão da noção de trabalho no

pensamento ocidental desde o mundo grego até a moderna sociedade burguesa.

Outros estudos buscam explicitar como surgiu e se desenvolveu o sentido que

temos hoje de trabalho reduzido a emprego como quantidade de tempo pago por uma

determinada atividade. Naredo (2006) efetiva uma análise na qual examina os valores,

concepções e modos de vida que predominaram antes que se tivesse a idéia atual de

trabalho. Em seguida, mostra a gênese da visão produtivista de trabalho ao longo do

século XVIII, quando o modo de produção capitalista torna-se dominante e se

desenvolve a idéia de riqueza, produção e de sistema econômico. Por fim, analisa as

determinações que estão provocando a crise da função produtivista e social que se

atribuía ao trabalho em nossas sociedades. A relevância de sua análise, concorde-se ou

não com ela, situa-se em mostrar as conexões entre ciência, ideologia e sociedade e

entre linguagem e pensamento.

No campo da batalha das idéias como espaço de luta de classe, tem sido

importante o desenvolvimento de textos, partindo especialmente da obra de Lukács

(1976 e 2004) sobre a ontologia do ser social em Marx, que tratam o trabalho na sua

dimensão ontocriativa, em contraposição às formas históricas que assume, mormente o

trabalho sob os modos de produção escravocrata ou servil e capitalista.

Na sua dimensão ontocriativa, explicita-se que, diferente do animal, que é

regulado e programado por sua natureza, por isso não projeta sua existência, não a

modifica, mas adapta-se e responde instintivamente ao meio, os seres humanos criam e

recriam, pela ação consciente do trabalho, sua própria existência.

Antes, o trabalho é um processo entre o homem e a natureza, um processo em

que o homem, por sua própria ação, medeia, regula e controla seu metabolismo

com a natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural como uma força

natural. Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes à sua

12

corporeidade, braços, pernas, cabeça e mãos, a fim de se apropriar da matéria

natural numa forma útil à própria vida. Ao atuar, por meio desse movimento,

sobre a natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo,

sua própria natureza (Marx, 1983, p. 149).

Sob essa compreensão, o trabalho, como nos mostra Kosik (1968), é um

processo que permeia todo o ser do homem e constitui a sua especificidade. Por isso

ele não se reduz à atividade laborativa ou emprego. Mészáros (1981) traz uma

distinção importante entre trabalho como mediação de primeira ordem, em Marx

processo antediluviano entre o homem e a natureza, para designar sua compreensão

ontológica de trabalho, e mediação de segunda ordem, para designar as formas

históricas que ele assume. Dos autores brasileiros, destacaram-se nessa tarefa

especialmente Leandro Konder, Carlos Nelson Coutinho, José Paulo Neto, Ricardo

Antunes. No esforço de compreender o trabalho, “os mundos do trabalho” no

movimento histórico social, destaco os trabalhos de Antunes (1999, 2006). Não cabe

aqui retomar esse debate por serem as obras desses autores amplamente difundidas.

No que concerne aos aspectos que busco ressaltar sobre a historicidade dos

sentidos do trabalho, emprego e classe social a análise mais fecunda e densa a

encontramos na tradição marxista anglo-saxônica, especialmente em Eric Hobsbawm,

Raymond Willians e Eduard Thompson. No Brasil, na mesma direção, destacam-se as

análises de Francisco de Oliveira e Florestan Fernandes. Neste item tomo apenas um

aspecto que ao meu juízo permite uma ponte para o diálogo sobre os fundamentos do

pensamento de Marx e a necessidade de, a partir dos mesmos, buscar compreender o

presente7.

Raymond Williams, ao tratar a teoria da cultura construindo o que denominou

materialismo cultural, indica a tarefa por fazer para entender como as categorias

trabalho, emprego e classe social vão assumindo diferentes significados. Trata-se do

esforço de saturar as categorias de historicidade. Com base em seu materialismo

cultural, vai tratar de um vocabulário de cultura e sociedade (Williams, 2007). Entre

outras palavras ou categorias, mostra os diferentes sentidos que vão assumir trabalho,

emprego e classe social.

O materialismo cultural, nos termos colocados por Williams é entendido

7. Parece-me, neste particular, pertinente a análise que Perry Anderson (1985) nos oferece sobre o

marxismo ocidental. Indica-nos Anderson que quando a tradição marxista francesa enveredou na análise

do discurso perdeu a batalha das idéias já que neste terreno o estruturalismo é imbatível. Ao contrário, a

13

[...] como um processo produtivo (material e social) e das práticas específicas,

as “artes”, como usos sociais de meios materiais de produção (da linguagem

como consciência prática às tecnologias específicas da escrita e de formas da

escrita, passando pelos sistemas eletrônicos e mecânicos de comunicação)

(Cevasco, apud Williams, 2007, p.17-18 ).

Tomando a ênfase de Gramsci sobre a questão da hegemonia, Williams, num

texto provocativo – Você é um marxista, é você marxista?8 –, explicita como se efetiva

a dominação de classe na relação poder, propriedade privada e cultura.

Podemos então afirmar que a dominação essencial de determinada classe na

sociedade mantém-se não somente, ainda que certamente se for necessário,

pelo poder, e não apenas, ainda que sempre pela propriedade. Ela se mantém

também inevitavelmente pela cultura do vivido: aquela saturação do hábito, da

experiência, dos modos de ver, que é continuamente renovada em todas as

etapas da vida, desde a infância, sob pressões definidas e no interior de

significados definidos... (Williams, 2007, p. 14).

É dentro dessa perspectiva que Williams dá pistas de como as palavras e as

categorias vão construindo, no tecido social e cultural, os diferentes sentidos, estando

estes atravessados pela dominação de classe. Assim, trabalho no sentido de fazer algo

ou a algo feito tem uma ampla gama de aplicações. Mostra Williams a forte relação

entre trabalho e labor (labour) em seu sentido medieval de faina e de dor. Já no século

XIII, “os trabalhadores manuais receberam a designação de laboures (trabalhadores,

operários), e a oferta desse tipo de trabalho generalizou-se como mão-de-obra (labour)

desde o século XVII. Trabalho adquiriu então um sentido mais geral de atividade”

(idem, ibidem, p. 396).

É com o desenvolvimento das relações sociais produtivas capitalistas que o

trabalho assume o sentido de emprego remunerado e trabalhador para designar a classe

trabalhadora.

Estar empregado (to be in work) ou desempregado (to be out of work) era

estabelecer uma relação definida com pessoa que controlava os meios do

esforço produtivo. Então trabalho deslocou-se, em parte, do próprio esforço

produtivo para a relação social dominante. É somente neste sentido que se pode

dizer que uma mulher que cuida da casa e cria os filhos não trabalha (idem,

ibidem, p. 397,).

A redução do trabalho de atividade vital do ser humano para produzir seus meios

de vida a emprego vincula-se, pois, a uma dupla determinação: o desenvolvimento

tradição anglo-saxônica manteve-se fiel a Marx e Engels na pesquisa histórica, terreno onde se pode

superar o estruturalismo. ( Anderson, 1985).

14

concomitante da palavra trabalho, do termo emprego e das relações sociais dominantes.

Assim Williams mostra que o termo emprego tem origem obscura e bastante coloquial

no sentido de lump (massa informe, monte) ou de piece (pedaço, parte). É no século

XVII que assume o sentido de quantidade limitada de trabalho. Assim, “jobbing

(trabalho de empreitada) e jobber (trabalhador de empreitada), em sentido ainda

vigentes, passaram a significar a execução de pequenos trabalhos ocasionais” (idem,

ibidem, p. 398). De seu sentido restrito e, por vezes, pejorativo, como jobbery

(traficância, negociata), passou a ter uso mais universal e comum para designar

ocupação regular e paga.

Os termos trabalho e emprego, mostra-nos Williams, interagiram tanto no seu

desenvolvimento interno quanto em sua inter-relação. Com efeito, com o

desenvolvimento do modo de produção capitalista, o trabalho, na sua dimensão

ontológica, forma específica da criação do ser social, é reduzido a emprego – uma

quantidade de tempo vendida ou trocada por alguma forma de pagamento. Dessa

redução ideológica resulta que, no senso comum, a grande maioria das pessoas entenda

como não trabalho o cuidar da casa, cuidar dos filhos etc.

Quando relacionamos o trabalho e o trabalhador ao sentido de classe e classe

social, eles ganham novas determinações, também histórica e socialmente construídas.

Por isso, é crucial, ainda que de forma breve, que se faça, com Williams, o mesmo

percurso de trabalho e emprego com o termo classe social9.

De imediato Williams assinala que o termo classe é duplamente complexo.

Primeiro, pela amplitude dos sentidos que assume; segundo, na complexidade dos

significados que ela assume na divisão social. Na sua origem tinha um sentido restrito

relacionado à propriedade.

Classis se referia a uma divisão de acordo com a propriedade que possuíam os

romanos.[...] logo o uso se ampliou, primeiro como termo de organização

eclesiástica (as assembléias ou classes ou sínodos) e, mais tarde, um termo geral

para divisão ou grupo (classe das plantas). (idem, ibidem, p. 85).

A historicidade da construção e do desenvolvimento de classe no seu sentido

moderno para designar classes sociais específicas é enfatizado por Williams ao mostrar

que o mesmo se define entre os anos 1770 e 1840, justamente o período da Revolução

8 Ver Raymond Williams, “You`re a Marxist, Aren`t You? (Williams, 2007, p. 14). Para um

aprofudanamento do seu pensamento, ver, também, Willians, 1969 e 1979.

15

Industrial e da reorganização decisiva da sociedade. “A história da introdução de classe

como uma palavra que substituiria designações mais antigas para as divisões sociais tem

relação cada vez maior de que a posição social é construída e não simplesmente

herdada” (idem, ibidem, p. 87). A perspectiva política do sentido de classe social se

afirma e se impõe com as revoluções americana e francesa, mas não sem dificuldades,

tanto pela resistência dos pensadores conservadores quanto pela superposição de

sentidos. É nesse contexto que surge a categorização de classe baixa, média e alta.

Segundo Williams, nos embates sobre direitos políticos, sociais e econômicos, a

partir de 1790, um novo sentido contrapõe:

[...] as classes produtoras ou úteis (trabalhadores, artesãos, comerciantes e toda

a profissão útil à sociedade) à classe privilegiada (sacerdotes, cortesãos,

contadores públicos, comandantes de tropas, em resumo os agentes civis e

militares ou religiosos do governo)10. Ou seja, uma contraposição que

caracteriza as classes trabalhadoras como classes úteis ou produtivas para

distinguir-se e opor-se aos privilegiados ou ociosos. Esse uso, que se combina

de modo peculiar com o modelo de mais baixa, média e mais alta, conservou-se

importante e ao mesmo tempo confuso (idem, ibidem, p. 89)

De acordo com Williams, Owen, em 1818, foi quem empregou por primeiro a

denominação classes trabalhadoras “no contexto específico e inconfundível das relações

entre ‘trabalhadores’ e ‘seus empregadores’” (idem, ibidem, p. 90). A partir de 1840, a

expressão classe trabalhadora, no singular, foi sendo usada nas análises socialistas; no

plural, nas descrições conservadoras.

Ao mesmo tempo que o sentido e o significado de classe social vão se

consolidando, mostra-nos Williams que eles carregam ambigüidades que se mantêm até

hoje, tanto no terreno não marxista quanto no marxista. A ambigüidade, ainda em 1844,

dava-se entre trabalhador e operário. Para Cockburn, os únicos trabalhadores eram

aqueles que trabalhavam com as mãos, embora tanto para trabalhador como para

operário houvesse a referência a trabalho manual.

Uma lei de 1875 estabeleceu uma definição jurídica para essa situação: a

expressão trabalhador (...) refere-se a qualquer pessoa que, sendo operário,

criado doméstico, jornaleiro, artífice, artesão ou que se dedique a qualquer

trabalho manual (...), foi contratada ou trabalha para um empregador (idem,

ibidem, p. 91).

9 Isso é particularmente importante para, na próxima seção, mostrar alguns aspectos no mínimo

problemáticos das posições de Lessa e Tumolo nas críticas que efetivam a produções de pesquisadores no

campo social e educacional.

16

Do mesmo modo se anota a divisão binária ou tripartite de classe, tanto

indicando ordens ou posições sociais (alta, média e baixa) ou agrupamentos econômicos

(empregadores e empregados), ou ainda, nas categorizações de John Stuart Mill

(proprietários da terra, capitalistas e trabalhadores) e em Marx no volume III de O

Capital (trabalhadores assalariados, capitalistas e proprietários de terra) (idem,

ibidem, p. 94). Com o desenvolvimento capitalista, na linguagem marxista prevaleceu a

divisão binária entre burguesia e proletariado.

Williams e Thompson trazem indicações importantes para o desenvolvimento do

próximo item sobre as tensões no âmbito marxista e mesmo em Marx ao mostrar a

distinção da classe em termos de relações econômicas, que pode ser uma categoria

como de assalariados, e a classe enquanto formação social no plano histórico. Para

Williams, Marx usa os dois sentidos, sendo que a descrição de classe mais freqüente

utilizada por ele é de classe como formação, exemplificando com um texto da Ideologia

Alemã e outro de O Dezoito Brumário.

Os indivíduos singulares formam uma classe somente na medida em que têm de

promover uma luta contra outra classe; de resto, eles mesmos se posicionam uns contra

os outros, como inimigos na concorrência (ideologia Alemã.. (Marx, apud Willians, op.

cit. p. 94).

Em seguida, todavia, indica Williams, a classe em Marx aparece como categoria

econômica, incluindo todos os que estão objetivamente naquela situação econômica e

como formação.

Na medida em que milhões de famílias camponesas vivem em condições

econômicas que as separam umas das outras, e opõem seu modo de vida, seus

interesses e sua cultura aos de outras classes da sociedade, esses milhões

formam uma classe. Mas na medida em que existe entre os pequenos

camponeses apenas uma ligação local, em que a similitude de seus interesses

não cria entre eles comunidade alguma, ligação nacional alguma, nem

organização política, nesta exata medida não constituem uma classe11 (O

Dezoito Brumário de Luiz Bonaparte, ( Marx, apud Willians, op cit. p. 95.

Essa dificuldade, para Williams, evidencia-se também no debate entre

consciência de classe e classe objetivamente medida:

10 Essa distinção é apresentada por Williams pór meio de uma citação do livro de Volnei, publicado em

1795: The Ruins of de Revolutions of Empires. Ver Williams, 2007, p. 89.

11 Nesta passagem de análise histórica concreta fica evidente quando Marx se refere às classes

fundamentais que definem a estrutura específica do modo de produção capitalista – proprietários privados

dos meios e instrumentos de produção e trabalhadores que vendem sua força de trabalho – de outras

classes que se articulam às mesmas.

17

É evidente que consciência de classe só pode pertencer a uma formação. Luta

de classe, conflito de classes, guerras de classes, legislação classista,

preconceito de classe dependem da existência de formações, embora isso possa

ser muito desigual ou parcial no interior das classes e entre elas (idem, ibidem,

p. 95).

Um exemplo emblemático do tema a que se refere Williams é o debate entre

Edward P. Thompson e Perry Anderson. Para este, a análise do primeiro, ao centrar-se

sobre experiência de classe, elide a classe como estrutura objetiva, tese da qual Ellen M.

Wood não compartilha, evidenciando que Thompson não nega a existência de uma

estrutura objetiva de classe, mas indica o fato de que a grande maioria dos que

estruturalmente pertencem à classe trabalhadora e vivem objetivamente a experiência

dessa classe não tem consciência de classe12.

Thompson, na mesma direção, dá uma indicação ainda mais clara sobre distintas

formas de abordar a questão da classe.

Ao tomarmos a classe como categoria historiográfica, poderemos ver

historiadores dispondo do conceito com dois significados diferentes: a) com

referência ao conteúdo histórico correspondente, empiricamente verificável; e

b) como categoria heurística ou analítica, recurso para organizar uma evidência

histórica cuja evidência direta é muito mais escassa. No meu modo de ver, tal

conceito pode ser adotado com propriedade em ambos os sentidos. Todavia,

confusões geralmente surgem quando nos deslocamos de uma acepção para

outra (Thompson, 2008, p. 1, grifos meus )13. .

Do exposto até aqui fica claro que trabalho, emprego e classe social estão, em

seu desenvolvimento, imbricados e os sentidos e significados que assumem têm

determinações histórico-sociais. Para o que o GT Trabalho e Educação tem como

horizonte básico, desde sua origem, de um trabalho teórico que ajude a entender as

relações entre trabalho, relações sociais capitalistas e educação numa perspectiva de luta

de classes, parece-nos crucial o que é, para Williams, em nossos dias, uma crítica

militante.

[...] sei que há um trabalho fundamental a ser feito em relação à hegemonia

cultural. Acredito que o sistema de significados e valores que a sociedade

capitalista gera tem de ser derrotado no geral e no detalhe por meio de um

trabalho intelectual e educacional contínuo. (...) temos de aprender e ensinar uns

aos outros as conexões que existem entre formação política e econômica e, talvez,

mais difícil, formação educacional e formação de sentimentos e de relações, que

são os nossos recursos em qualquer forma de luta (Cevasco apud Williams, 2007,

p. 15).

12 Ver, a esse respeito, Wood (2003).

13 De um texto publicado pela revista eletrônica Marxismo Revolucionário Atual. 2008. (www.mra.org.br)

e extraído da coletânea As peculiaridades dos ingleses e outros artigos (Negro e Silva, 2007).

18

Essa advertência, do aprender e ensinar uns aos outros, é também repleta de

indicações e lições para a natureza do debate do ponto a seguir se nosso objetivo

comum é fortalecer as lutas que buscam não simplesmente reformar o capitalismo, mas

sua superação.

A compreensão imanente e a historicidade dos fundamentos

do pensamento de Marx

A breve análise até aqui desenvolvida revela que os termos ou categorias ou

conceitos discutidos têm suas variações de sentido marcadas pelo desenvolvimento

histórico-cultural, por valores, tradições, por concepções ideológicas e disputas sociais.

Marx e Engels desenvolveram suas análises no contexto onde os mesmos se consolidam

dentro da definição do modo de produção capitalista como forma dominante de relações

sociais. O que Marx e Engels fizeram foi, mediante pesquisa meticulosa, dar-lhes rigor

científico dentro da concepção histórica de realidade social e do método do

materialismo histórico-dialético14. Assim mesmo, como destaca acima Williams, suas

análises não ficaram livres de ambigüidades que rendem polêmicas até o presente.

Nesta seção busco discutir o posicionamento sobre a análise imanente ou dentro

da ortodoxia (Lessa, 2007) de parte da obra de Marx e suas implicações teóricas no

plano da ação política, especialmente, ainda que não só, no campo educacional.

O esforço de análises dentro de uma perspectiva imanente e heurística, como foi

assinalado na introdução e sublinhado por Thompson, não só é pertinente como de

crucial importância para afirmar os fundamentos das contribuições de Marx e Engels e

de outros marxistas que seguiram seu legado. Assim, o esforço dos trabalhos de Sérgio

Lessa e sua contribuição na explicitação da ontologia do ser social de Marx e concepção

ontológica de trabalho são de enorme relevância.

As ponderações que coloco a seguir referem-se a seu livro Trabalho e

proletariado no capitalismo contemporâneo (2007), no qual, a partir de uma

compreensão imanente do trabalho em Marx, centrado sobretudo no livro I de O capital,

efetiva críticas a diferentes autores do campo social e educacional nos aspectos

destacados na introdução deste texto, cujas análises se esforçam para entender o

14 Num texto produzido na década de 1980, analiso a dialética materialista histórica como uma postura ou

concepção de realidade histórica, um método e uma práxis para caracterizar aspectos inseparáveis da

análise de Marx e Engels (Frigotto, 1989).

19

trabalho, as classes sociais, a ciência e tecnologia e os processos educativos no seu

desdobramento e desenvolvimento históricos.

Mesmo que Lessa chame atenção para a questão histórica e para as mediações,

de forma insistente, por diferentes razões a ênfase de sua análise parece fixar-se no

plano da categorização, referido por Williams, e de um procedimento heurístico nos

termos colocados por Thompson, que enfatiza ser a classe no seu sentido heurístico

inseparável da luta de classes:

Em meu juízo foi dada excessiva atenção, freqüentemente de maneira ahistórica,

à “classe” e muito pouca, ao contrário, à luta de classe. Na verdade, na

medida que é mais universal, luta de classes me parece ser o conceito

prioritário. Talvez diga isso porque luta de classes é evidentemente um conceito

histórico, pois implica um processo, e portanto seja o filósofo, o sociólogo ou o

criador de teorias, todos têm dificuldades em utilizá-lo. Para dizê-lo com todas

as letras: as classes não existem como entidades separadas que olham ao redor,

acham um inimigo de classe e partem para a batalha [...]. Classe e consciência

de classe são sempre o último e não o primeiro degrau de um processo histórico

(Thompson, op.cit. p. 2).

Na minha leitura, o foco na imanência e numa compreensão heurística do

trabalho, do proletariado e do sujeito revolucionário é que conduz Lessa no texto aqui

referido, ao trabalhar mais com antinomias do que com a contradição, e portanto com

excessiva atenção ao que é trabalho, proletariado e classe, em detrimento ao

movimento histórico de como se produz o trabalho, o proletariado e a luta de classes

como processos históricos. Daí, penso, advêm as dificuldades de reconhecer o caráter

contraditório, como veremos, da ciência, tecnologia, do avanço das forças produtivas,

do papel da escola e dos processos educativos no interior das relações sociais

capitalistas. Na mesma perspectiva, e pelas mesmas razões, parecem situar-se as

análises de Tumolo, no que concerne à questão do trabalho como principio educativo.

Nesse sentido, caberia explicar melhor alguns aspectos, para enfatizar o que

estou destacando das análises em discussão.

Uma primeira observação reside na defesa de Lessa da ortodoxia como

metodologia na análise imanente do texto de Marx para evitar o ecletismo. Mesmo

considerando o cuidado que Lessa tem de contrapô-la ao dogmatismo, o sentido

corrente de ortodoxia relaciona-se à doutrina e às posturas rígidas ou dogmáticas. Esse

sentido, na análise de Lessa, reforça-se pela recorrência do argumento de autoridade

como critério da maior veracidade da interpretação imanente. No mesmo plano

metodológico, talvez a perspectiva de Karel Kosik (1986) de monismo materialista para

20

distinguir as análises entre estrutura econômica (marxismo) e fator econômico

(sociologismo) seja mais adequada para contrapor-se ao pluralismo e ao ecletismo

metodológicos15.

Um segundo aspecto, na mesma ordem de questões, diz respeito às tensões

internas da compreensão imanente do trabalho e classe social e a questão da

historicidade. Sob as tensões internas, José Paulo Netto, ao caracterizar o sentido

ontológico de trabalho como constitutivo do ser social, observa que o ser social não se

reduz e esgota no trabalho, ainda que permaneça como objetivação fundante.

Quanto mais se desenvolve o ser social, mais as suas objetivações transcendem

o espaço ligado diretamente ao trabalho. No ser social desenvolvido,

verificamos a existência de esferas de objetivação que se autonomizaram das

exigências imediatas do trabalho – a ciência, a filosofia, a arte etc. (...) O

trabalho, porém, não só permanece como objetivação fundante e necessária do

ser social – permanece ainda como o quase poderia chamar de modelo das

objetivações do ser social (Netto, 2006, p. 43).

Isto fica, a meu ver, ainda mais claro na abordagem de Kosik, tanto do ponto de

vista das tensões internas quanto da historicidade, no seu esforço para superar uma

visão semântica e antinômica entre o trabalho (mundo da necessidade) a as atividades

humanas como livre criação (mundo da liberdade). A possibilidade de dilatação da

liberdade do ser humano é indissociável da satisfação, no grau historicamente possível,

do mundo da necessidade.

Do mesmo modo, dentro de uma compreensão dialética, o que distingue trabalho

de outras atividades humanas não é algo eterno. É o processo histórico real que vai

definir como uma mesma ação humana pode ser considerada trabalho ou não trabalho.

O trabalho é um agir humano que se move na esfera da necessidade. O homem

trabalha enquanto seu agir é suscitado e determinado pela pressão da

necessidade exterior cuja consecução se chama necessidade natural ou social.

Uma atividade é ou não trabalho, dependendo de que seja ou não exercida

como uma necessidade natural, isto é, como um pressuposto necessário à

existência. Aristóteles não trabalhava. Um professor de filosofia e

interpretações metafísicas de Aristóteles são um emprego, isto é, uma

necessidade, socialmente condicionada, de procurar os meios materiais de

sustento e de existência (op. cit. p. 187, grifo meu)

15 “O monismo materialista que concebe a realidade como um complexo constituído e formado pela

estrutura econômica e, portanto, por um conjunto de relações sociais que os homens estabelecem na

produção e no relacionamento com os meios de produção pode constituir a base de uma coerente teoria

das classes e ser o critério para a distinção entre mutações estruturais – que mudam o caráter da ordem

social – e mudanças derivadas, secundárias, que modificam a ordem social, sem porém mudar

essencialmente seu caráter” (op.cit. p. 105).

21

Por isso, para ele a divisão do agir humano entre trabalho, esfera da necessidade

e esfera da liberdade

capta a problemática do trabalho e não trabalho apenas aproximadamente e

apenas sob certos aspectos. [...] Nessa distinção fica oculta uma ulterior

característica essencial da especificidade do trabalho como um agir humano que

não abandona a esfera da necessidade, mas ao mesmo tempo a supera e cria nela

os reais pressupostos de liberdade humana. [...] A relação entre necessidade e

liberdade é uma relação historicamente condicionada e historicamente variável

(idem, ibidem, p. 188, grifo meu).

Os aspectos anteriores conduzem-me, finalmente, a uma terceira ordem de

dificuldades dos pressupostos da análise imanente sobre trabalho, proletariado e classe

trabalhadora. A justificativa bastante exaustiva e eloqüente para eleger o Livro I de O

Capital como o ponto mais alto para uma leitura imanente da problemática do trabalho

e os corolários conseqüentes para definir o proletariado e trabalhadores certamente

sustenta-se como uma decisão que dá segurança metodológica e coerência de

argumento. Todavia, resta saber se essa delimitação, mesmo que amplamente

argumentada, não limita o alcance de sua análise e, por conseqüência, fragiliza as

críticas a pesquisadores que, sem desprezar a análise imanente, arriscam o terreno mais

complexo, mediado, contraditório da pesquisa histórica.

Com efeito, parece-me bastante contraditório eleger, por mais relevante, uma

parte da obra de Marx cujo pensamento, como assinala Lefbreve referindo-se a ele e a

Engels, “não foi apenas um pensamento em luta e em ação – criando-se no decorrer de

suas lutas –, mas um pensamento em movimento. (...) Um pensamento em movimento

não pode estudar-se nem compreender-se senão acompanhando o seu movimento”

(Lefebvre, 1981)16.

Esse movimento é evidenciado por Ruy Mauro Marini (2000), ao mostrar que o

conceito de trabalho produtivo, ainda que posto claramente no capítulo I de O Capital,

somente se equaciona no capítulo XVIII do livro III, ao serem estudados os operários

assalariados mercantis.

Do mesmo modo que o trabalho não retribuído ao operário cria diretamente

mais-valia para o capital produtivo, o trabalho não retribuído dos operários

assalariados comerciais cria para o capital comercial uma participação naquela

mais-valia (Marx, O Capital, cap. III, p. 287, apud Marini, 2000, p. 249).

16 Lefebvre busca demonstrar que as obras filosóficas de Marx ou de Marx e Engels se integram à ciência

histórica, à economia e à política. Por isso rejeita tanto a leitura de um jovem Marx (humanista) e de um

Marx maduro (cientista) quanto que as obras de juventude substituam o Marx da maturidade.

22

Para Marini, o mesmo vale para os demais operários da circulação naquelas

atividades indispensáveis para que esta tenha curso (banco, publicidade etc.) pelo que

conclui: “é possível sustentar que restringir a classe operária aos trabalhadores

assalariados que produzem a riqueza material, isto é, o valor de uso sobre o qual

repousa o conceito de valor corresponde a perder de vista o processo global de

reprodução capitalista” (idem, p. 250).

Por outro lado, Hobsbawm (o historiador vivo que talvez mais se tenha ocupado

da obra de Marx), numa entrevista sobre sua mais recente publicação, sobre os

Manuscritos econômicos 150 anos depois, destaca duas razões de seu impacto

internacional e de sua importância atual. Primeiro porque permitiu, no campo marxista,

no contexto do dogmatizado corpus do marxismo ortodoxo no mundo do socialismo

soviético, ampliar a análise com um texto que não podia ser considerado herético.

Segundo, porque trata de um conjunto de reflexões sobre assuntos importantes que não

foram considerados em O Capital ou desenvolvidos por Marx em nenhum outro lugar

(Hobsbawm, 2008).

Também seguindo a argumentação de Wolfgang Leo Maar, que ao comentar o

pensamento de Francisco de Oliveira realça o vigor que emerge da perspectiva de sua

análise que se concentra no âmbito da produção da sociedade, privilegiar o livro I de O

Capital para discutir trabalho, classe proletária e trabalhadores, traz o risco de fixar-se

no trabalhador coletivo, na perspectiva da acumulação e num estreitamento do espaço

da luta de classes e de seus sujeitos.

O trabalho é intrinsecamente social. Neste sentido, a sociedade pode ser vista

como um grande trabalhador coletivo que pode, na profundidade em que cabe

pensar na produção da sociedade, ser formulado em duas determinações

sociais. Um trabalhador coletivo pela perspectiva da acumulação e, neste

sentido, nós pensaríamos um trabalhador coletivo em que haja uma

universalização do trabalho abstrato tal qual a conhecemos hoje. Mas nós

precisamos pensar também no trabalhador coletivo numa outra determinação

social, que é a perspectiva do trabalho que produz a sociedade (Maar, 2006,

p. 44).

É justamente dentro dessa perspectiva que Francisco de Oliveira percebe que

atualmente a disputa pelo controle e manejo do fundo público constitui-se numa arena

da luta hegemônica, da luta de classes e, portanto, das formas sociais do futuro.

Por fim, nesta terceira ordem de questões, um ulterior aspecto me parece central

e, de certa forma, reporta ao conjunto de ponderações até aqui apresentadas. Se, por um

lado, as análises imanentes são necessárias e importantes, elas necessitam estar atentas

23

ao processo histórico real. Isso pela razão fundamental de que pelo menos os pensadores

marxistas que pensam com Marx para além de Marx aqui referidos enfatizam como

legado fundamental de Marx a concepção materialista de história e o método históricodialético

de apreensão da realidade.

Até onde percebo os autores que privilegiam a análise histórica, os argumentos

de Lessa para concluir que, em suas obras, Ricardo Antunes, Marilda V. Iamamoto e

Dermeval Saviani – cada um com suas particularidades e com sua relevância – dão O

adeus ao trabalho no Brasil são, no mínimo, lacunosos de mediações históricas. Ou,

talvez, dito de outra forma, ele comete o equívoco apontado por Thompson de passar de

uma perspectiva heurística da historiografia para avaliar pesquisas que buscam, no

plano histórico real, perquirir, num terreno menos seguro e cheio de dificuldades e

sujeito a equívocos de diferentes ordens, o imbricado, contraditório e complexo

desenvolvimento do processo de trabalho, do proletariado e das classes sociais e dos

processos educativos ao longo do século XX.

Não vou me ater aqui a maiores desdobramentos desse debate, apenas destacar

brevemente elementos para chegar a uma conclusão oposta à de Lessa sobre os três

autores criticados e as implicações para os aspectos mais diretamente imbricados com o

debate no âmbito educacional, tanto de Lessa quanto de Tumolo.

Tomo um primeiro elemento de um pequeno e clássico texto de Francisco de

Oliveira: O elo perdido; classe e identidade de classe, na introdução do qual fala do

método no estudo das classes. Para Oliveira,

[...] a opacidade da divisão e das relações entre as classes é de tal densidade que

o trabalho teórico de dar-lhes transparência caminha no sentido inverso do

movimento da história do capitalismo contemporâneo. [...] Isto é, torna-se mais

complexo e difícil re-conhecer, em fim, o perfil das classes sociais. [...] As

classes não se constituem em si e nem mesmo para si, mas para as outras

(Oliveira, 1987a, p.10-11).

Ao analisar os mundos do trabalho e a formação da classe operária, Hobsbawm

também demarca o caráter histórico e processual da constituição das classes:

A história operária é parte da história da sociedade, ou melhor, de certas

sociedades que possuem características em comum. Relações de classe,

qualquer que seja a natureza de classe, são relações entre classes ou camadas de

classes que não podem ser adequadamente descritas se analisadas isoladamente

ou apenas em termos de suas divisões ou estratificações internas. Isso implica

um modelo do que são as sociedades e de como funcionam (Hobsbawm, 1987,

p. 29).

24

Ao justificar o título – O fazer-se da classe operária – de um capítulo do livro

Mundos do Trabalho, adverte que não quer sugerir que as classes tenham início, meio e

fim, como a construção de uma casa. “As classes nunca estão prontas no sentido de

acabadas ou de terem adquirido sua feição definitiva. Elas continuam a mudar”

(Hobsbawm, 1987, p. 273).

Uma das mudanças profundas para a classe trabalhadora situa-se no fato de que

cada vez mais a ciência e a tecnologia se tornam forças produtivas do capital e se

voltam contra a classe trabalhadora. Marx, nos Grundrisse, já indicava claramente essa

tendência, mostrando que a criação da riqueza dependia cada vez menos do tempo e do

quantum de trabalho utilizado e mais do estado geral da ciência e de sua utilização na

produção, e que, sob o domínio do capital, isso se voltava contra o trabalhador e sua

classe.

A máquina, triunfo do ser humano sobre as forças naturais, converte-se, nas

mãos dos capitalistas, em instrumento de servidão de seres humanos a estas

mesmas forças [...]; a máquina, meio infalível para encurtar o trabalho

cotidiano, prolonga-o, nas mãos do capitalista [...]; a máquina, varinha de

condão para aumentar a riqueza do produtor, empobrece-o em mãos do

capitalista (Marx apud Paris, 2002, p. 235).

A magnitude do desemprego estrutural e da indigência do trabalho certamente é

mais evidente hoje que na época de Marx. Nos últimos vinte anos, foram profundas as

mudanças no mundo e no Brasil. Os profissionais empregados com carteira assinada e

os direitos advindos de um contrato de trabalho pelas lutas históricas da classe

trabalhadora são cada vez em menor número. Os maiores sindicatos de trabalhadores

assalariados não são mais dos metalúrgicos nem dos bancários, mas da área de serviços

como educação e saúde.17

Essa realidade faz com que a definição de quem é o proletário, quantos são os

proletários, onde estão e quem constitui o sujeito revolucionário hoje se torne mais

complexa e que, certamente, se essa fosse a realidade do tempo de Marx, ele a tomaria

como um problema a decifrar.

Por isso parece-me que o desafio é muito menos tentar classificar quem é ou não

é proletário na precisão semântica e imanente e mais na direção que nos aponta Carlos

17 Poder-se-ia afirmar com segurança que os metalúrgicos e bancários brasileiros, que, a partir da década

de 1970, pela magnitude e organização de seus sindicatos, produziram duas lideranças que

respectivamente se tornaram presidente da República (Luiz Inácio Lula da Silva) e governador do Rio

Grande do Sul (Olívio Dutra), não terão mais essa capacidade pelo simples fato de que robôs e máquinas

digitais ocuparam seus postos, ampliando o desemprego estrutural, o trabalho precário e “informal”.

25

Nelson Coutinho. Apoiado na herança, sobretudo de Marx e Gramsci, ele sinaliza que o

grande desafio para a classe trabalhadora é “construir uma intersubjetividade

revolucionária, ou seja, um conjunto de sujeitos que são plurais, mas que convergem e

se unificam na luta contra o capital” (Coutinho, 2002, p. 38, grifo meu). Vale dizer,

uma convergência na luta de classes.

Dentro do que expus até aqui, parece-me que a conclusão de Lessa, de que as

análises de Antunes, Iamamoto e Saviani dão adeus ao trabalho no Brasil, incorre em

dois equívocos. Primeiro os filia, de forma lógica mas não histórica, às abordagens de S.

Malett e André Gorz e M. Sabel a J. Lojkine e Adam Shaff. Isso porque – e ai está o

segundo equívoco – é exatamente ao contrário. No âmbito especifico das mudanças do

mundo do trabalho18, Antunes (1999), Iamamoto (2007) e Saviani (1994 -), na relação

com a educação, não dão adeus ao trabalho, mas estão empenhados em compreender o

processo histórico do trabalho e das classes sociais e buscam perceber como se

constitui, diferentemente dos séculos XVIII e XIX, o sujeito revolucionário. O sentido

semântico dos termos é importante, mas, como vimos, histórica e socialmente

construído. Nesse aspecto, ganha precedência a historicidade nos termos da tese II de

Feuerbach e do que explicitam sobretudo Williams e Thompson.

Outro aspecto da crítica de Lessa baseado na análise imanente do trabalho e do

proletariado como sujeito revolucionário refere-se a algumas publicações de Dermeval

Saviani (1994) e a um livro de Frigotto (1995) para caracterizar como ilusões o caráter

contraditório da ciência como força produtiva e do desenvolvimento do capitalismo e

das perspectivas da escola unitária, omnilateral e integral. A leitura que Lessa extrai é

de que estes educadores estariam passando a idéia de que do “próprio desenvolvimento

capitalista, passaríamos ao comunismo, à ‘sociedade regulada’ de Gramsci ou ao ‘reino

da liberdade’, famosa expressão de Marx” (Lessa, 2007, p. 121).

Como base desta afirmação, Lessa retira de Saviani um trecho em que analisa o

caráter contraditório dos processos produtivos sob nova base científica e tecnológica e

em que a idéia de escola unitária e da formação omnilateral

[...] estaria deixando o terreno da utopia e da mera aspiração ideológica, moral e

romântica para se converter numa exigência posta pelo próprio

18 Em diferentes passagens Lessa assinala a expressão mundos do trabalho – “esta sim quase misteriosa”

(Lessa, 2007, p. 9) como a evidência de imprecisão semântica do trabalho. Preocupação que tem validade

se o contexto da análise do trabalho estiver no campo do imanente e do heurístico, mas não é pertinente se

se está tentando entender como o trabalho se apresenta num determinado contexto e desenvolvimento

histórico. O historiador marxista Hobsbawm (1987), não por acaso, intitulou uma obra clássica sua

Mundos do trabalho.

26

desenvolvimento do processo produtivo. Indícios desta tendência estão

aparecendo cada vez mais fortemente [...] inclusive entre os empresários, de que

o que importa, de fato, é uma formação geral sólida, a capacidade de manejar

conceitos, o desenvolvimento do pensamento abstrato (Saviani, 1999, p. 164-

165, apud Lessa, 2007, p. 120-121, grifo meu)19.

E, ao assinalar que Saviani não esteve sozinho ao alimentar tais ilusões acerca

do capitalismo contemporâneo, remete a uma nota na qual afirma: “Frigotto, por

exemplo, enxerga na transformação em curso uma positividade que pode ser

politicamente capturada com as forças comprometidas com a efetiva emancipação

humana” (Frigotto, 1995, p. 7, apud Lessa, 2007, p. 121).20

E, para mostrar a ilusão sobre a busca e a luta concreta para construir espaços

educacionais na perspectiva da escola unitária, remete a Francisca Maurilene do Carmo.

Entre alguns educadores perdeu-se de vista que é “impossível, na lógica deste

sistema, a realização de uma educação geral e politécnica, configurando desta

forma como utopias educacionais as propostas que anuncia dentro do capital

como capazes de formar o indivíduo omnilateral (Carmo, 2003, p. 121).

Como corolário de suas críticas às ilusões de Saviani, conclui que:

O fato de alguns dos mais significativos pedagogos de esquerda terem aderido a

essas teses tornou aos educadores mais complicada e difícil a percepção da

essência da transformação em curso: a passagem de um patamar mais elevado

de extração de mais-valia, uma intensificação dos processos alienantes oriundos

do capital (Lessa, 2007, p. 121).

Da leitura que faço das obras de Saviani e naquilo que exponho no livro citado,

não encontro a possibilidade de uma visão linear da ciência e tecnologia e do avanço

das forças produtivas pela qual se estaria indicando a passagem mecânica do

desenvolvimento capitalista para, na afirmação de Lessa, o comunismo, a sociedade

regulada de Gramsci ou o reino da liberdade, famosa expressão de Marx. Por outro

lado, também não consigo ver de onde deduz de que na obra de Saviani e das análises

que faço não esteja explícita a compreensão de que se exacerba no capitalismo atual a

superexploração com a intensificação da mais-valia relativa e, para os que são

19 Lessa não inclui nas referências bibliográficas esta obra de 1999. Todavia, o trecho se refere à obra

mencionada anteriormente (Lessa, 2007, p. 90), que é de Saviani (1994).

20 Coincidentemente, não se encontra na página 7 do livro referido ( Educação e crise do capitalismo

real, Frigotto, 1995) o pedaço de frase pinçado e citado; ali começa o sumário do livro, em boa parte do

qual, como veremos a seguir, é tratado o caráter contraditório e os limites da ciência e do sistema

capitalista. Também trata das teses do fim da sociedade do trabalho e da não-centralidade do trabalho em

Claus Off, Adman Schaf e Robert Kurtz.

27

empregados, a ampliação da mais-valia absoluta e, portanto dos processos mais

violentos alienantes do sistema capital.

Do mesmo modo, não poderia deduzir que está se afirmando que dentro do

sistema capitalista é possível desenvolver, nas condições próprias de uma sociedade

sem classes, cuja travessia supõe o socialismo, uma educação unitária, integral,

omnilateral, politécnica ou tecnológica. O que percebo na obra de Saviani é o que está

claro na citação analisada, dentro da compreensão de que não só o capitalismo é uma

contradição em processo e, como insistia Marx, cada vez mais profunda e insanável,

como também existe antagonismo e luta contra-hegemônica. Ao dizer “indícios desta

tendência”, no que alcanço ler, ele não está afirmando nem que mecanicamente as

mudanças científicas e técnicas na base produtiva levem ao comunismo e ao reino da

liberdade nem que dentro do sistema capitalista a escola unitária e omnilateral sejam

possíveis. Apenas está apreendendo uma contradição e, com isso, a possibilidade de

disputar no conteúdo, no método e na forma a direção política na luta pela superação do

capitalismo.

A obra citada, Educação e crise do capitalismo real, foi produzida num contexto

de pós-derrota (mas não fracasso) do socialismo realmente existente (Hobsbawm), da

tese do fim da história de Fukuyama e de um crescente pessimismo da esquerda, dando

a impressão de que o capitalismo tem eternamente a chave para superar suas crises e a

ciência burguesa, as soluções eternas.

Isso redundaria na aceitação tácita da tese de Fukuyama de que estaria provado

que o capitalismo é a sociedade de tipo natural e, portanto, uma ilusão lutar por sua

superação. Busquei, com base em Marx e pensadores marxistas que produziram o

pensamento social crítico brasileiro, vários deles já referidos, trabalhar o

aprofundamento das contradições cada vez mais “profundas e insanáveis” do modo de

pensar burguês e da sociedade capitalista.

No plano das idéias, é só seguirmos o caminho percorrido ao longo de quatro

décadas por Frederic Hayek, pai do neoliberalismo, para ver que sua condição de

intelectual da classe capitalista não lhe permitiu jamais, dentro da concepção da

economia clássica e neoclássica, entender o conflito insolúvel entre indivíduo e

sociedade nas relações sociais capitalistas21. E isso, não fundamentalmente, por uma

premeditação maquiavélica. É algo mais radical, como mostra Marx. “São os limites de

21 Ver a esse respeito a análise de Paulani (2005).

28

uma época – de uma classe –, mais que um ‘egoísmo’ deliberado ou uma ‘mentira de

classe’ que explicam os limites das idéias...” (Marx, Carta a Weidemever, 1852). Por

essa razão, assinala Marx: “Presos às representações capitalistas [os economistas

burgueses] vêem como se produz dentro da relação capitalista, mas não como se produz

a própria relação” (Marx, apud Frigotto, 2006, p. 35)\.

Por isso, dialogando com Francisco de Oliveira, especialmente com a Crítica da

razão dualista (Oliveira, 1987b) e a tese do surgimento do antivalor (Oliveira, 1988), o

livro busca pensar o tempo presente22. Tratava-se não só de ver as contradições, mas

também de entender como dentro delas pode se dar a luta contra-hegemônica. A disputa

das concepções, teorias e práticas educativas e de ciência e tecnologia situam-se nesse

terreno.

O que Lessa não explica é a questão relativa ao processo de superação do modo

de produção capitalista. A ultrapassagem do capitalismo implica enfrentar, no plano da

práxis, o pântano contraditório da dialética do velho e de novo. Como ensina Gramsci,

velho que não quer morrer e novo que necessita nascer. Ou se começa a luta pela utopia

do socialismo e da educação omnilateral, unitária e politécnica no embate contraditório

da realidade rebelde historicamente existente ou teremos, como assinala Jameson, que

esperar deterioração total da terra e da natureza; ou remeter a um imaginário futuro, na

análise de Kosik (1969), a superação do sistema capitalista.

22 Para Roberto Schwarz, em várias ocasiões Chico acertou na análise quase sozinho, sustentando

posições e argumentos contrários à voz corrente da esquerda (Schwarz, Prefácio, apud Oliveira (2003, p.

22). Na ampliação do texto de 1988 sobre o anti-valor (Oliveira, 1998), evidencia hoje, mais uma vez que

acertou numa tese que lhe rendeu muitas críticas. Há dez anos afirmava: “O processo invisível por

excelência é o capital fictício, que viaja em tempo real-digital – de um para outro lugar do mundo: e viaja

em moléculas, que é o próprio dinheiro, não necessitando fixar-se em unidades físicas. Mesmo quando se

fixa em unidades industriais, o que preside a ordem desta fixação é o caráter fictício do capital dinheiro,

ao contrário da sociedade do conflito, em que o capital-dinheiro só existe depois de construir a força de

trabalho vivo. A sociedade da ordem jurídico-política é fundada na propriedade tangível, enquanto na

sociedade molecular-digital a regra é o intangível, o invisível (...). Na ordem jurídico-política em

destruição, uma ordem de proprietários, de sujeitos, constituem-se fóruns em que as partes do contrato

podem cobrar-se, mutuamente, pelos prejuízos ou agravos produzidos por um autor que se pode conhecer.

Na ordem-desordem molecular-digital, tal procedimento é impensável”. O episódio da falência do

Barings Bank da Inglaterra, motivada por um jovem especulador da Malásia, é emblemático nesse

sentido. “Detonou um processo que liquidou uma duplamente centenária instituição bancária.

Evidentemente, mesmo que se estabeleça a ação desse operador como sendo o momento inicial do Big

Bang, sua punição individual não repara uma perda em bilhões de dólares” (Oliveira, 1998, p. 8-9).

Agora, a cada dia que passa fica evidente que não se trata de um banco, mas de uma crise que desnuda o

sistema imundo da jogatina do capital fictício. O cinismo mistura salvação pelo fundo público e zombaria

e ironia com os que pagam a conta. Um exemplo dessa zombaria foi a “indecência de diretores do grupo

financeiro belga Fortis que fizeram um banquete para comemorar a salvação do grupo pelo fundo público

num jantar para 50 corretores ao preço módico de US$ 200 por pessoa (Jornal Valor Econômico, 13 de

outubro de 2008).

29

Sem dúvida, a análise de Lessa explicita o fetiche do determinismo da ciência,

da técnica e da tecnologia e dos processos educativos sob o sistema do capital tomados

como forças autônomas das relações sociais de produção, de poder e de classe. A forma

mais apologética desse fetiche aparece atualmente sob as noções de sociedade pósindustrial

e sociedade do conhecimento, que expressam a tese de que a ciência, a

técnica e as novas tecnologias nos conduziram ao fim do proletariado e à emergência do

cognitariado e, conseqüentemente, à superação da sociedade de classes sem acabar com

o sistema do capital.

Todavia, o fato de não perceber nenhuma positividade da ciência e tecnologia no

avanço das forças produtivas e da possibilidade de disputa das concepções, teorias e

práticas educativas na perspectiva de uma educação omnilateral e politécnica no interior

do sistema capitalista decorre do fato de não considerar, como analisa Jameson, que a

contradição, diferente da antinomia, como explicita a citação, tem que ver com forças,

contexto ou com o estado das coisas.23 Isso, para esse autor, conduz mais a uma

dedução lógica que histórica e à falta de imaginação.

Mesmo depois do “fim da história”, ainda parece persistir uma certa curiosidade

histórica em geral mais sistêmica do que meramente anedótica: não saber

somente o que vai acontecer depois, mas também uma ansiedade mais geral

sobre a sorte ou o destino do nosso próprio sistema ou modo de produção (...).

Parece que hoje é mais fácil imaginar a deterioração total da terra e da natureza

do que o colapso do capitalismo tardio; e talvez isso possa ser atribuído à

debilidade de nossa imaginação. (Jameson, 1997, p. 10-11)

A interpretação dessa falta de imaginação para Jameson resulta de uma

dominância de nosso tempo das análises antinômicas, campo mais seguro da linguagem

23 Das análises de Marx, sobre este aspecto, fica explicito, por um lado, a contradição entre a

capacidade exponencial da classe detentora do capital desenvolver as forças produtivas e a sua

incapacidade de socializar o resultado do trabalho. Por outro lado, também está mais que explícito em

Marx que a ultrapassagem desse sistema não se dará pela perspectiva do quanto pior melhor, mas do

aguçamento daquela contradição e da existência da consciência, de uma vontade coletiva ou de uma força

intersubjetiva revolucionária que entenda que é imprescindível a ruptura e que existe correlação de

forças para tal.. Gramsci, em Maquiavel, Política e Estado, dá os diferentes níveis de correlações de força

e as exigências para que uma tarefa revolucionária se torne viável. Dentro dessa compreensão, e Gramsci

(1976) entendeu isso já na década de 1930, nas condições nas quais se deu a Revolução Russa

dificilmente ela poderia manter-se sem que houvesse um movimento de ruptura mais amplo nos centros

mais desenvolvidos do sistema capitalista. Nessa direção de análise, pode-se afirmar que, do ponto de

vista das condições objetivas – avanço científico e tecnológico – há muitíssimo mais condições de

construção da sociedade socialista hoje do que em 1917. O que falta são as condições subjetivas ou a

força intersubjetiva revolucionária. A nova sociedade não começaria da pedra lascada, mas se

apropriando e redefinindo os rumos da ciência e da tecnologia. De mutiladora dos direitos fundamentais

do ser humano e de destruição das bases da vida em extensão de membros e sentidos humanos dilatando

um efetivo tempo livre e de liberdade.

30

que nos permite saber onde se está pisando. No campo da contradição, por lidar com a

historicidade, tal segurança desaparece.

Na antinomia você sabe onde está pisando. Ela afirma duas proposições que

efetivamente são radical e absolutamente incompatíveis, é pegar ou largar.

Enquanto a contradição é uma questão de parcialidades e aspectos; apenas uma

parte dela é incompatível com a proposição que a acompanha; na verdade ela

pode ter mais a ver com forças, ou com o estado das coisas do que com palavras

e implicações lógicas [...]. Enquanto a antinomia é, clara e inequivocamente

duas coisas separadas: y ou x, e isso de forma tal que faz a questão da situação

ou do contexto desaparecer por completo. Nossa época é bem mais propícia ao

terreno da antinomia do que da contradição. Mesmo no próprio marxismo, terra

natal desta última, tendências mais avançadas reclamam da questão da

contradição e se aborrecem com ela, como se ela fosse um remanescente do

idealismo, capaz de reinfestar o sistema de forma fatalmente antiquada (como

os miasmas ou a febre cerebral. (idem,ibidem, p. 17-18)

Por isso, parece-me que as afirmações sobre as ilusões de Saviani e dos

pedagogos de esquerda, com todas as imprecisões que possam ter de ordem semântica e

de análise histórica sobre o trabalho, proletariado, trabalhadores e classe social, é uma

expressão mais retórica e de caráter pejorativo, cujo efeito pode ser contrário ao que

Lessa certamente quer: reforçar: as teses da desecolarização da sociedade, do

pragmatismo e economicismo, as perspectivas do laissez-faire, ampliadas hoje pelas

teses do pós-modernismo e o desmantelamento do que define a profissão docente pelas

políticas neoliberais. 24

Por outro lado, se sairmos do campo da antinomia, ciência e tecnologia ou pura

negatividade ou pura positividade e lidarmos com o plano das contradições no seio do

capitalismo realmente existente e, portanto, com situações concretas e forças em

disputa, não me parece que se trate de uma ilusão a possibilidade de os educadores

disputarem, dentro da perspectiva da escola unitária e educação omnilateral, as novas

bases de conhecimento demandados pelo processo produtivo.

O fato de a fração brasileira da burguesia internacional e seus intelectuais terem

recentemente cunhado a expressão apagão educacional para reclamar que há falta de

trabalhadores qualificados para os setores que necessitam que eles dominem bases de

conhecimentos para o trabalho complexo indica, ao mesmo tempo, o limite de idéias

24 Dermeval Saviani, tendo presente o esvaziamento da função de organização, sistematização e produção

do conhecimento dos docentes (em todos os níveis de ensino, mas especialmente na educação básica)

numa recente entrevista, reclama: “Ao professor deve ser devolvida a sua função: ensinar” (Revista

Rubra, n. 3, Lisboa, out. 2008). Reitera aquilo que expõe no pequeno livro Escola e democracia (Saviani,

1986) com 40 edições, sobre especificidade da função política da escola e da educação escolar, que se dá

pela mediação das concepções, metodo dialético-histórico na apreensão dos conteúdos e dos fundamentos

científicos, na expressão de Gramsci, da sociedade dos homens e das coisas. Idéias cuja base pode ser

31

dessa burguesia, já que ela é a maior responsável por essa situação, e uma real

necessidade de elevar o patamar de escolaridade, certamente não para todos25. Com

isso, não se está sugerindo que se esteja “no mundo da liberdade” nem que estamos na

porta da sociedade socialista. O que se está dizendo que há contradições e que, numa

perspectiva de luta de classe, na superação do sistema capitalista, esta é uma questão da

práxis. “A escola, como o movimento operário, implica um equívoco: só conseguirá

interpretar plenamente seu papel numa sociedade renovada e, ao mesmo tempo,

compete-lhe, dia após dia, desempenhar um papel.” (Snyders, 1981, p. 392)26

Finalmente, uma breve análise do texto de Paulo Sérgio Tumolo – O significado

do trabalho no capitalismo e o trabalho como principio educativo: ensaio de análise

crítica (Tumolo, 2003), que, mediante uma leitura imanente de parte de O Capital de

Marx sobre trabalho concreto, trabalho abstrato e trabalho produtivo, conclui que sob

o capitalismo o trabalho não pode ser considerado princípio educativo. Situo o conteúdo

básico do texto nos termos apresentados pelo próprio autor.

O texto tem como finalidade analisar criticamente a concepção do trabalho

como princípio educativo, que tem sido utilizada para fundamentar propostas de

educação dos mais importantes movimentos sociais brasileiros, tais como o

MST e a CUT. À luz da contribuição teórica oferecida por Marx, sobretudo em

O Capital, discute o significado das três categorias fundantes de trabalho -

trabalho concreto, trabalho abstrato e trabalho produtivo (Tumolo, 2003, p. 1).

Tumolo justifica que, dado o número de educadores que se ocupam do tema,

seleciona apenas um trecho de um deles (Saviani, 1986ª) , afirmando que o mesmo

sintetiza a concepção presente no conjunto de seus estudiosos e serve de base, em

grande medida, para as propostas educativas dos referidos movimentos sociais (grifos

meus). Numa nota, a título de exemplo, nomeia treze educadores e 23 obras dos

mesmos, inclusive quatro de Dermeval Saviani. O trecho citado refere-se a uma

buscada em Marx, nas Instruções aos Delegados do I Congresso da Associação Internacional dos

Trabalhadores e na Crítica ao Programa de Ghota e O Capital.

25 Uma análise atual e importante sobre demanda e trabalho complexo no Brasil é efetivada por Lúcia

Maria Vanderlei Neves e Marcela Alejandra Pronko (2008). Em pesquisa que concluí recentemente

(Frigotto, 2008), no último capítulo discuto a relação quantidade e qualidade na educação tecnológica de

ensino médio e evidencio o espaço contraditório no qual se dão disputas no campo da educação e uma

análise do apagão educacional.

26 Lênin, como um dos mais importantes teóricos do marxismo do século XX e líder revolucionário, tinha

clareza sobre o papel contraditório da escola burguesa. Ao se dirigir aos jovens, após a Revolução de

1917, criticou a tendência de se ver tudo que se fez na velha escola como inútil e argumentava que a

teoria revolucionária, contraditoriamente, também resultou dela. “O marxismo é um exemplo de como o

comunismo resultou da soma de conhecimentos adquiridos pela humanidade” (Lênin, apud Frigotto,

2006, p. 190).

32

entrevista de Saviani publicada pela revista Bimestre, do MEC/INEP/Cenafor, uma das

quatro referências.

Na verdade, todo sistema educacional se estrutura a partir da questão do

trabalho, pois o trabalho é a base da existência humana, e os homens se

caracterizam como tais na medida em que produzem sua própria existência, a

partir de suas necessidades. Trabalhar é agir sobre a natureza, agir sobre a

realidade, transformando-a em função dos objetivos, das necessidades humanas.

A sociedade se estrutura em função da maneira pela qual se organiza o processo

de produção da existência humana, o processo de trabalho. (Saviani, 1986a, p.

14, apud Tumolo, 2003, p. 2)

Com base no pressuposto de que esse fragmento da entrevista de Saviani

representa sua obra sobre o tema e mais as 23 obras referidas, apenas como exemplo, de

treze pesquisadores e que a concepção do trabalho como princípio educativo trata

apenas de um lema, que carece de precisão e consistência teóricas, faz uma discussão

sobre as categorias enunciadas de acordo com Marx para ao final explicitar sua

conclusão.

Dado o conjunto de razões expostas, o trabalho não pode ser considerado como

princípio educativo de uma estratégia político-educativa que tenha como

horizonte a transformação revolucionária da ordem do capital. O trabalho só

poderia ser concebido como princípio balizador de uma proposta de educação

que tenha uma perspectiva de emancipação humana numa sociedade baseada na

propriedade social, vale dizer, na não-propriedade dos meios de produção, que,

dessa forma, teria superado a divisão e a luta de classes e, por conseguinte,

qualquer forma de exploração social, bem como o trabalho produtivo de capital

e o trabalho abstrato, porque teriam sido eliminados o capital e o mercado.

(Tumolo, 2003, p. 10)

Tiradas as premissas sobre trabalho como principio educativo e a forma de

encaminhá-las e sua conclusão, o texto expressa uma interpretação das categorias

trabalho concreto, trabalho abstrato e trabalho produtivo em Marx. Trata-se de uma

análise que também se pauta pela visão imanente e heurística do texto de Marx que tem

sua pertinência, como reiterei ao longo deste texto. Mas a forma de articular essa

interpretação de Marx com o que apresenta sobre trabalho como principio educativo

expressa, além de um raciocínio silogístico, equívocos de conteúdo, método e de forma.

Mesmo que o autor assuma tratar-se de um texto introdutório, não pode cometer

a impropriedade de pinçar uma citação de uma entrevista numa revista, sendo que na

bibliografia cita mais três obras de Saviani, nem partir da suposição de que os demais

doze autores e suas 19 obras referidas estejam contemplados em tal citação. O mais

estranho e paradoxal é que a citação não trata diretamente do trabalho como princípio

33

educativo, mas da relação da estruturação do sistema educacional e o trabalho como

produção da existência humana. Do mesmo modo, a maior parte das obras referidas não

trata do trabalho como principio educativo.

Também afirmar, particularmente em relação ao MST, que a concepção do

trabalho como princípio educativo é tomada apenas como um lema que carece de

precisão e consistência teóricas, sem considerar e debater minimamente a produção

sobre educação feita por intelectuais do MST como Roseli Caldart (2000) e o diálogo e

a produção de educadores como a que fazem com Miguel Arroyo, um dos treze

pesquisadores referidos, é uma generalidade e uma impropriedade. Um exame mais

cuidadoso do debate teórico e da proposta pedagógica do MST, por ser um movimento

que coloca a educação como mediação da luta de classes, revela que aí se efetiva um

esforço sistemático de compreender tanto o trabalho como principio educativo quanto

algo distinto como indico a seguir, como principio pedagógico, aqui se valendo das

contribuições de Pistrak e Paulo Freire, entre outros educadores27.

Todavia, é no plano da vida concreta no acampamento e na escola que se pode

observar o esforço de superar as marcas de uma personalidade bizarra com resquícios

do homem da caverna (Gramsci, 1978, p. 12) conformados na condição de colonos que

os adultos e crianças se exercitam no trabalho como principio educativo. Assim, quando

as crianças participam de pequenas tarefas do dia-a-dia e têm seu tempo lúdico e de

escola garantidos, nada tem a ver com exploração do trabalho infantil. Explorados, não

por vontade dos pais mas por condição de vida, eram na condição de colonos ou quando

trabalhavam como meeiros ou assalariados28.

A exposição de Tumolo, nesse texto, é um exemplo da discussão antinômica,

posto por Jameson, e das implicações da passagem de um estudo imanente e heurístico

para uma análise histórico-concreta. Nos termos do autor:

O trabalho só poderia ser concebido como princípio balizador de uma proposta

de educação que tenha uma perspectiva de emancipação humana numa

sociedade baseada na propriedade social, vale dizer, na não-propriedade dos

meios de produção (Tumolo, 2003, p.10)

27 Não se está dizendo que o MST não tenha conflitos e contradições internas e imensos limites nas suas

lutas, impostos pela classe dominante brasileira e pelas condições em que os seus militantes produzem

sua existência. Este é um tema sobre o qual são doutores, e nos ensinam muito. Também não se está

dizendo que esses conceitos estão resolvidos na teoria e na prática.

28 Outra, ainda que possa ter dimensões positivas, é a visão da Organização Internacional do Trabalho

quando, por pressão da concorrência intercapitalista, produz leis contra o trabalho infantil. Soa uma lei

34

Dada a premissa, o autor passa a analisar em Marx as categorias de trabalho

concreto, trabalho abstrato e trabalho produtivo e de forma correta demonstra que sob o

capital o trabalho avilta, degrada, aliena cada vez mais o trabalhador. E conclui que, em

sendo isso, o trabalho não pode ser tomado como princípio educativo.

Do ponto de vista da lógica, a argumentação interna é de um silogismo sem contradição

em seus termos. A questão é outra. A premissa é que tem de ser discutida. Posto o

trabalho humano no plano histórico em que negatividade e positividade coexistem e se

definem no campo de luta de forças, a leitura que podemos fazer dessa questão em Marx

e Gramsci me parece outra.

Da leitura que faço do trabalho como princípio educativo em Marx, ele não está

ligado diretamente a método pedagógico nem à escola, mas a um processo de

socialização e de internalização de caráter e personalidade solidários, fundamental no

processo de superação do sistema do capital e da ideologia das sociedades de classe que

cindem o gênero humano. Não se trata de uma solidariedade psicologizante ou

moralizante. Ao contrário, ela se fundamenta no fato de que todo ser humano, como ser

da natureza, tem o imperativo de, pelo trabalho, buscar os meios de sua reprodução –

primeiramente biológica, e na base desse imperativo da necessidade criar e dilatar o

mundo efetivamente livre. Socializar ou educar-se de que o trabalho que produz valores

de uso é tarefa de todos, é uma perspectiva constituinte da sociedade sem classes.

Por ser o trabalho (mediação de primeira ordem) o que possibilita que o ser

humano produza-se e reproduza-se, e por isso, na metáfora de Marx, antediluviano, e

não o trabalho escravo, servil e o trabalho alienado sob o capital (mediações de segunda

ordem), a internalização, desde a infância, do princípio do trabalho produtor de valores

de uso é fundamental. É dentro desse contexto que entendo a expressão “mamíferos de

luxo”, de Gramsci, para significar formação e socialização que aliena a possibilidade de

perceber que tudo que é produzido para o ser humano produzir a si mesmo como ser da

natureza vem do trabalho29.

cínica, quando não oferece às crianças e aos jovens que trabalham precocemente uma alternativa de

produção digna de sua existência.

29 Por isso que também as teses de que o movimento social, a greve, as lutas são educativos – e o são –,

mas não fazem como “princípio educativo” da mesma natureza do trabalho produtor de valores de uso.

Aqui reside a necessária distinção entre trabalho e práxis, já que o trabalho não esgota a construção do ser

social, mas ele é também fundamento da práxis. As greves, as lutas dos movimentos sociais tendem

desaparecer numa sociedade cujo fim é a emancipação humana. O trabalho produtor de valores de uso

continuará sendo uma necessidade antediluviana para todos os seres humanos pelo simples fato de que

esse ser da natureza e com necessidades de elementos da natureza ou de produtos desenvolvidos pela

criação humana continuará existindo. Manacorda mostra uma ênfase específica de Gramsci, com base em

Marx, ao colocar “o conceito e o fato” do trabalho como “principio imanente da escola elementar”. Marx,

35

É dessa perspectiva que Marx entende, na minha leitura, a união de trabalho e

ensino desde a infância e, ao mesmo tempo, a luta contra a exploração do trabalho

infantil. A conclusão de Tumolo sobre a impossibilidade de considerar o trabalho como

princípio educativo sob o capitalismo decorre não só por não trabalhar neste texto o

caráter contraditório das relações sociais, mas de uma inversão histórica: o capital se

torna a categoria antediluviana. Tomado o trabalho como processo que cria e recria o

ser humano, ele não é redutível às formas históricas, sob as sociedades de classe que

cindem o gênero humano, ao trabalho escravo, servil e capitalista. Por isso, até mesmo o

trabalho escravo não é pura negatividade. Este parece ser um dos sentidos da dialética

do senhor e do escravo. Do mesmo modo, não é estranho em Marx reconhecer o caráter

civilizatório da revolução burguesa, no plano do pensamento e no plano das relações de

produção.

Na introdução da Crítica da filosofia do Direito em Hegel, Marx (2006) reconhece que

a burguesia acertou contas com as concepções metafísicas e que agora a tarefa é o

acerto de contas mediante a crítica ao Direito, à política etc., da visão de mundo e de

conhecimento. Do mesmo modo, no Manifesto Comunista Marx e Engels explicitam o

caráter revolucionário da burguesia.

Historicamente, a burguesia desempenhou um papel revolucionário. Onde quer

que tenha sumido o poder, a burguesia pôs fim a todas as relações feudais,

patriarcais e idílicas. Destruiu impiedosamente os vários laços feudais que

ligavam o homem aos seus “superiores naturais”, deixando como única forma a

relação de homem a homem laço do frio interesse, o insensível “pagamento à

vista” (Marx e Engels apud Laski, 1982, p. 96).

Explicitam ao mesmo tempo, no plano das contradições históricas, a

positividade e negatividade desse processo. A positividade, pela destruição de velhas

relações feudais e trabalho escravo; a negatividade da burguesia ao não abolir as classes

e constituir-se na classe do frio interesse.

Na recente conferência sobre o sentido e a atualidade do Manifesto Comunista,

Francisco de Oliveira sublinhou que a encomenda da Liga dos Justos era um manifesto

contra as injustiças. Marx e Engels fazem um manifesto que explicita que a propriedade

privada dos meios e instrumentos de produção é a fonte de todas as injustiças e que,

portanto, a luta é para suprimir a propriedade privada e a sociedade de classes. Por outro

salienta Manacorda, refere-se sobretudo à concepção de trabalho como uma relação imediatamente

instituída entre a sociedade e a natureza para transformar a natureza e socializá-la, uma concepção que

sintetiza todos os termos marxianos da história da indústria como relação entre homem e natureza e como

processo de humanização da natureza (Manacorda, 1991, p. 136).

36

lado, destaca Oliveira, o Manifesto não indica que a direção da história seja rodar a

roda para trás ou, do autor em outras análises, a tese do quanto pior melhor. Por isso,

ao ser instado a avaliar o caráter alienante da Rede Globo, reconhecendo e criticando

seu poder alienador, adverte que o problema não é a sua destruição, mas como se

apropriar desse potencial noutra direção. Num plano mais geral, essa é a mesma

conclusão de Hobsbawm (2008) quando afirma que o problema não é a globalização ou

a internacionalização, mas esta forma de internacionalização. A tese do

internacionalismo, destaca, é uma tese cara a Marx.

A título de conclusão

Pela natureza e finalidade deste texto, não cabe propriamente uma conclusão. O

que trago é a demarcação de alguns aspectos dele que, julgo, possam facilitar o debate.

Creio que seu sentido maior é sintetizado pelo que nos interpela Williams sobre

a tarefa da crítica militante na luta pela hegemonia cultural, que é aprender e ensinar

uns aos outros as conexões que existem entre formação política e econômica e, talvez,

mais difícil, formação educacional e formação de sentimentos e de relações, que são os

nossos recursos em qualquer forma de luta.

E por tratar-se de um espaço formativo de uma associação científica com a

presença dominante de jovens pesquisadores, professores, lideranças sociais, outro

aspecto central emana da observação de Engels: o risco de deduções que encerram o

assunto a partir do termo materialista. Toda a história precisa ser reestudada, as

condições de existência das diversas formações sociais precisam ser examinadas em

detalhe antes de induzir delas as correspondentes concepções políticas, jurídicas,

estéticas, filosóficas, religiosas.

Do primeiro eixo do texto, explicita-se que a polissemia do trabalho resulta de

um complexo processo que se desenvolve historicamente nas relações sociais e se

vincula à produção material e na cultura, mediante valores, símbolos, tradições e

costumes. O sentido que vai assumir, tanto na linguagem do senso comum quanto nos

âmbitos das ciências, na sociedade de classes, resulta de relações de poder e dominação.

O percurso feito, sobretudo com Williams, sobre trabalho, emprego e classe

social dá conta primeiramente do processo da constituição do seu significado e sentidos

no plano social e cultural e, ao mesmo tempo, de que os três vocábulos passam a ter um

vínculo inseparável no processo de definição do modo de produção capitalista. Marx e

37

Engels vivem esse contexto e se esmeram, particularmente Marx, em desmascarar os

sentidos da ciência burguesa e em lhes dar rigor e concepção históricos. Nem Marx nem

Engels ficaram imunes às ambigüidades, como se destacou. Não só por isso, mas

também por isso, o permanente debate no campo marxista.

O debate em relação ao tema das classes sociais, da classe proletária e o próprio

sentido de classe como estrutura, categoria ou como processo e formação histórica

trazidos neste texto é emblemático. Penso que ajuda muito a nos situarmos neste debate

as distinções que faz Raymond Williams à abordagem da classe como categoria ou

como formação; num mesmo sentido, Edward P. Thompson distingue na historiografia

uma abordagem de classe como categoria heurística ou analítica e como conteúdo

histórico. Para Thompson, a classe só pode ser considerada uma categoria no sentido

heurístico. No sentido histórico, classe é uma relação de forças. Classe e consciência de

classe são sempre o último – e não o primeiro – degrau de um processo histórico real.

Encontramos a mesma compreensão em autores que tratam a classe em seu

sentido histórico real. Para Williams, consciência de classe e luta de classe dizem

respeito a formações históricas concretas. Hobsbawm fala do fazer-se classe e que elas

nunca estão prontas. Oliveira, que as classes não se constituem em si e nem mesmo para

si, mas para as outras.

O segundo eixo do texto tem como centro o sentido do trabalho e das classes na

sua relação com o campo educativo. Ele se põe como uma exigência da área na medida

em que as abordagens de Lessa e Tumolo discutidas aqui, com abrangências e graus de

aprofundamento distintos, interpelam o campo educativo e, sobretudo, a produção

oriunda do GT Trabalho e Educação da ANPEd. Para Lessa, a confusão semântica em

relação a trabalho, classe proletária, sujeito revolucionário conduz os mais destacados

pedagogos de esquerda a ilusões em relação a ciência, tecnologia e educação integral e

omnilateral. Para Tumolo, o não-entendimento do trabalho concreto, abstrato e

produtivo em Marx no sistema do capital conduz educadores e movimentos sociais a

entender o trabalho como princípio educativo – um lema sem consistência teórica.

O que se buscou evidenciar é que Lessa e Tumolo fazem suas análises dentro da

perspectiva imanente e heurística dos textos de Marx, tomando sobretudo o Livro I de O

Capital. Uma abordagem não só sustentável como importante na compreensão dos

fundamentos do pensamento de Marx e de outros pensadores clássicos. Trata-se de

abordagem tão importante quanto a abordagem que analisa as formações históricas.

38

Como adverte Thompson, confusões geralmente surgem quando nos deslocamos de

uma acepção para outra.

Nos textos de Lessa e Tumolo aqui analisados, o que busquei evidenciar é que

esse deslocamento se efetivou. Dar um tratamento imanente e heurístico a trabalhos de

natureza histórica os conduziu a não tratar a contradição no sentido da materialidade do

processo histórico em que negatividade e positividade são indissociáveis.

Disso decorre, na minha compreensão, a dificuldade de Lessa perceber que

Antunes, Iamamoto e Saviani, com recortes diversos, estão empenhados em entender o

trabalho no processo histórico e, como tal, situam suas análises no sentido oposto das

abordagens do adeus ao trabalho. Do mesmo modo, entende-se sua dificuldade de ver a

possibilidade de positividade da ciência, da técnica e avanços das forças produtivas

dentro do sistema capitalista ou ter uma perspectiva de educação escolar omnilateral ou

politécnica.

No mesmo sentido e de forma mais intensa, Tumolo efetiva esse deslocamento e

é conduzido à percepção de que é impossível pensar o trabalho como princípio

educativo sob o capitalismo. Neste, o trabalho se efetiva de forma puramente negativa.

Paradoxalmente, na forma com que conduz a análise, acaba dando ao capital o caráter

antediluviano.

Do que foi exposto, para concluir, parece-me importante, na linha apontada por

Florestan Fernandes, de que o intelectual não cria o mundo em que vive, mas faz muito

quando consegue ajudar a compreendê-lo para transformá-lo, assinalar dois riscos

possíveis do deslocamento das análises imanentes e heurísticas para análises históricas

como as que acabamos de discutir.

O primeiro é de conduzir a um imobilismo e a um beco sem saída, colocando

para o futuro a tarefa de superação do trabalho, da ciência e da técnica e da educação

alienadores. No plano da história e da práxis, a questão que nos interpela é: quem

constrói e como se constrói a travessia? Por certo nessa travessia, se entrarmos no

pântano e de terno branco e sairmos de terno branco, como lembra João Cabral de Melo

Neto, a poesia perde a graça.

O outro risco, este específico para o campo da educação, é de que, ao tratar as

análises dos pesquisadores criticados, mesmo com as ressalvas feitas, de ilusões ou

lemas sem consistência teórica, acabe-se reforçando as posturas conservadoras e

neoconservadoras ou pós-modernas já hegemônicas nestes tempos de capitalismo

39

tardio. Por isso, o cuidado, em nossas análises, lembrando o Marx do Dezoito Brumário

de Luis Bonaparte, é para que a frase não vá além do conteúdo.

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