Porto Alegre-RS, 26 de janeiro de 2012
Quero saudar muito especialmente todos os participantes do Fórum Social Mundial
e deste fórum temático...
Saudar o governador Tarso Genro,
O prefeito Fortunati,
Os ministros, aqui,que me acompanham...
As lideranças políticas...
Os representantes dos movimentos sociais que hoje se reúnem neste Fórum...
Companheiras e companheiros:
É uma grande alegria poder voltar a Porto Alegre para participar de mais uma
reunião do Fórum Social Mundial. Aqui estive em 2001. Participei, naquela
ocasião, do primeiro encontro do Fórum, quando eu ainda era secretária de
Energia do governador Olívio Dutra, a quem saúdo agora, meu companheiro e meu
amigo.
Desde então, esta cidade transformou-se em referência para todos aqueles que
buscavam criar uma alternativa ao desequilíbrio da situação econômica e
política global. Aqui, se afirmou a ideia de que um outro mundo é possível.
Aqui, estavam, como hoje aqui estão, os que não sucumbiram ao pensamento único,
nem acreditaram no fim da história.
Mas muita coisa ocorreu nesses últimos 11 anos. A crise, que vinha latente da
economia internacional transformou-se em crise real a partir de 2008 e, desde
então, não parou de agravar-se. Nesses últimos 11 anos surgiram também coisas
muito positivas. Na América Latina, foram sendo construídas respostas
progressistas e democráticas aos desequilíbrios internacionais. Na maioria dos
países da região, dentre eles o meu país – o Brasil –, estão em curso
importantes transformações econômicas, sociais e políticas.
Nossos países crescem, enquanto outras partes do mundo vivem a estagnação, a
recessão e, muitas vezes, um grande desemprego. Nossos países reduzem a pobreza
e a desigualdade social, e, como eu disse, em outras regiões, aumenta a
desigualdade, aumenta a exclusão e direitos são perdidos.
Nossos países, hoje, não sacrificam sua soberania frente às pressões de
potências, grupos financeiros ou agências de classificação de risco, mas,
sobretudo, nossos países avançam fortalecendo a democracia. Na América do Sul,
como diz aquela canção da Revolução dos Cravos, da Revolução Portuguesa: “O
povo é quem mais ordena”.
Companheiras e companheiros,
É muito importante que este encontro do Fórum Social Mundial ocorra poucos
meses antes da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável
– a Rio+20. A crise financeira e as incertezas que pairam sobre o futuro da
economia mundial dão uma significação especial à Rio+20.
Em grande parte do mundo desenvolvido, busca-se enfrentar a crise com medidas
fiscais regressivas, que têm consequências sociais e ambientais nefastas e
trazem consigo perigosas ameaças, como eu disse: o desemprego, a xenofobia, o
autoritarismo, a paralisia no enfrentamento do aquecimento global, além de
ameaças à paz mundial.
Há poucos meses, estive em Cannes, na reunião do G-20, que nos propunham novo
mundo, novas ideias. A despeito dos avanços que eventualmente logramos naquele
encontro, confesso que não fiquei satisfeita com os resultados. Não é fácil
produzir novas ideias e alternativas quando estamos dominados por preconceitos
políticos e ideológicos. Conhecemos bem essa história.
Nos anos 80 e 90, confrontados com profundos desequilíbrios macroeconômicos,
foram preconceitos políticos, foram preconceitos ideológicos que impingiram aos
países da América Latina o modelo conservador que levou nosso país à
estagnação, à perda de espaço democrático e soberano, aprofundando a pobreza, o
desemprego e a exclusão social. Hoje, essas receitas fracassadas estão sendo
propostas novamente na Europa.
A Rio+20, que terá a participação de chefes de Estado e de Governo, mas também
de expressivos setores da sociedade civil, deve ser um momento importante de um
processo de renovação de ideias, diferentemente das Conferências das Partes, as
chamadas COP. Centrado na importante questão ambiental e nos problemas da
mudança do clima, o encontro do Rio vai enfrentar uma questão mais ampla e mais
decisiva: estará no centro dos debates um novo modelo de desenvolvimento,
contemplando três dimensões – a econômica, a social e a ambiental.
Queremos que a palavra “desenvolvimento” apareça, de agora em diante, sempre
associada à expressão “sustentável”. Ao lado dos objetivos de desenvolvimento
do milênio, é necessário estabelecer também os objetivos do desenvolvimento
sustentável. Esses objetivos, que abrangem compromissos e metas para todos os
países do mundo, têm, no seu centro, o combate à pobreza e à desigualdade e a
sustentabilidade ambiental.
Assumimos aqui, como sempre assumimos, ao longo do governo Lula e do meu
governo, que é possível crescer e incluir, proteger e conservar. O que estará
em debate na Rio+20 é um modelo de desenvolvimento capaz de articular o
crescimento e a geração de emprego; a erradicação da pobreza e a redução das
desigualdades; a participação social e ampliação de direitos, a educação e a
inovação tecnológica; o uso sustentável e a preservação dos recursos ambientais.
Em Copenhague, há quase três anos, nosso governo assumiu novas
responsabilidades nas questões relacionadas à mudança do clima. Apresentamos
lá, em Copenhague, para o mundo, e aqui, no Brasil, como compromisso voluntário
do nosso governo, a significativa redução de emissões de gás de efeito estufa.
Lamentavelmente, alguns outros países relutaram – e até hoje relutam – em
anunciar seus esforços para a redução das emissões. Somos o país que, de acordo
com as Nações Unidas, mais tem feito pela redução das emissões de gás de efeito
estufa em todo o planeta. Esses compromissos são parte integrante da grande
transformação que está em curso em nosso país nos últimos nove anos.
No meu governo, quando falamos de desenvolvimento sustentável, eu quero dizer
aqui, de forma clara, no que estamos falando: para nós, desenvolvimento
sustentável significa crescimento acelerado de nossa economia para poder
distribuir riqueza; significa criação de empregos formais e expansão da renda
dos trabalhadores; significa distribuição de renda para pôr fim à miséria e
reduzir a pobreza, com políticas públicas que provoquem melhoria da educação,
da saúde, da segurança pública e de todos os serviços públicos fornecidos pelo
Estado brasileiro; crescimento regional equilibrado da renda, que corrija os
desequilíbrios entre as regiões do país, que corrija a condenação de uma parte
deste país ao baixo desenvolvimento, como foi o caso do Norte e do Nordeste;
criação de um amplo mercado de bens de consumo de massas, que passe a dar
sustentação interna ao nosso desenvolvimento; significa também que o Brasil
está se transformando, e nós o faremos se transformar, cada dia mais, do ponto
de vista socioeconômico, em um país de classes médias; significa
desenvolvimento que tenha na sustentabilidade ambiental uma condição
imprescindível.
Nossas escolhas, em matéria de energia, de segurança alimentar, de
infraestrutura logística, de inovação tecnológica, levam em conta o uso
sustentável de nossos recursos ambientais.
Além disso, o desenvolvimento sustentável significa aprofundamento dos
mecanismos de participação social e o fortalecimento da nossa democracia;
significa incentivo e defesa dos nossos valores, da nossa cultura, da nossa
diversidade cultural; finalmente, significa uma inserção soberana e competitiva
no mundo.
Companheiras e companheiros,
O grande nó que o presidente Lula começou a desatar, a partir de 2003, era o da
exclusão e o da desigualdade social. Estamos ganhando essa batalha, como nos
mostram os 40 milhões de brasileiros e brasileiras que deixaram a miséria e
ascenderam às classes médias. E nossos esforços para erradicar essa chaga
social, nos próximos anos, será a determinação de fazer cumprir o programa
Brasil sem Miséria.
O lugar que o Brasil, hoje, ocupa no mundo não é consequência de nenhum milagre
econômico, como acontecia no passado. É resultado do esforço do povo brasileiro
e de seu governo, que souberam optar por um novo caminho. O Brasil, hoje, é um
outro país. Ninguém, ninguém, nenhum grupo pode nos tirar isso. Nós somos, hoje,
um país mais forte, mais desenvolvido e mais respeitado. Um país que convive
harmonicamente com seus vizinhos da América do Sul e da América Latina e do
Caribe, e que quer construir com eles um polo de desenvolvimento e de
democracia no mundo.
Da mesma forma, abrimos novas relações com os nossos irmãos africanos, com o
Mundo Árabe, dando uma especial atenção à Palestina, que esperamos possa
constituir-se, brevemente, como Estado livre, Estado pacífico e democrático e
com sua soberania garantida.
Nos países chamados Brics, nós lutamos por uma nova ordem econômica e política
mundial multipolar, mais justa, mais democrática. Em todos os fóruns globais,
somos partidários do multilateralismo, do desarmamento e das soluções
negociadas para todas as ameaças à paz mundial.
Companheiras e companheiros,
A tarefa que nos impõe este Fórum, assim como a Rio+20 e outros eventos que
virão, é o de desencadear o movimento de renovação de ideais e de novos
processos, absolutamente necessários para enfrentar os dias difíceis em que
hoje vive ampla parte da humanidade.
Estudos recentes da OCDE, que congrega os países desenvolvidos, revelam um
processo crescente de concentração de renda e aumento da desigualdade nos
países desenvolvidos e mesmo em alguns emergentes. A contrapartida disso tudo
é, e está sendo hoje, a explosão do desemprego e a expansão da pobreza nos
países pelo mundo afora.
Esses dois fenômenos – desemprego e desigualdade social – são particularmente
cruéis quando se trata de nações ricas, que conquistaram direitos e agora os
perdem. E são também cruéis porque atingem, prioritariamente, os jovens, as
mulheres e os imigrantes. A dissonância entre a voz dos mercados e a voz das
ruas parece aumentar, cada vez mais, nos países desenvolvidos, colocando em
risco não apenas conquistas sociais, mas a própria democracia.
O mundo do pós-neoliberalismo não pode ser o mundo de pós-democracia, como bem
apontou, recentemente, um filósofo alemão. A indignação de jovens, de mulheres,
de militantes, que ocupam as ruas de dezenas de cidades do mundo, é um sintoma
importante que não pode ser desconsiderado.
Nesse contexto, as mulheres desse mundo afora têm tido um protagonismo
crescente e determinante para as mudanças. Como afirmei na abertura da
Assembleia Geral da ONU, tenho certeza de que nós, mulheres, faremos tudo para
garantir que o século XXI seja o século das mulheres.
As organizações da sociedade civil e os governos progressistas, cada um na sua
dimensão, podem fazer desses primeiros anos do novo milênio o anúncio de uma
nova era. Para isso, é decisivo o fortalecimento dos laços de solidariedade e
da cooperação Sul-Sul que unem os nossos povos.
Os grandes movimentos da humanidade são feitos de ação, mas também, de
esperança. Foi a esperança que moveu a minha geração, décadas atrás. Hoje,
quando olho para o caminho percorrido e para os objetivos alcançados, só posso
dizer a vocês: valeu a pena, companheiros e companheiras.
É essa esperança, é essa esperança que nos une e nos mobiliza para a Rio+20. É
essa esperança que deve sempre nos guiar na busca de um novo modo de vida,
inclusivo e sustentável.
Sabendo que o papel da sociedade civil será determinante para o êxito da
Rio+20, conto com a mobilização, com o engajamento e a presença de vocês no Rio
de Janeiro. Eu tenho certeza: um outro mundo é possível.
Até o Rio de Janeiro.
Elzamir Ferreira